As mudanças da política externa da Turquia são freqüentes.
Ora pende para Ocidente, ora para os países que rejeitam a liderança de Washington.
Nesse movimento pendular, ela sempre mantém algumas portas abertas para o lado de que se descola.
Por volta dos primeiros anos do milênio, as ações turcas eram bem vistas por Washington.
O governo de Ancara mantinha relações diplomáticas com Israel, chegava a realizar manobras militares conjuntas com o exército de Telaviv.
Sem, porém, deixar de apoiar a causa palestina.
E promovia reformas liberalizantes para ser aceito na Comunidade Européia.
Em 2010, começou a virada. Os dois chefes de governo do Brasil e da Turquia, Lula e Erdogan, apresentaram um plano de paz para a questão nuclear.
O Irã achou ótimo mas, Obama e sua secretária de
Estado, Hillary Clinton, sem maiores explicações.
Indignação na Turquia.
Que ficou ainda maior quando tropas israelenses atacaram o navio de paz que se dirigia a Gaza, matando ativistas turcos.
Erdogan não poupou palavras de condenação a Israel.
Em seguida, suspendeu as relações diplomáticas com Telaviv, sob aplausos do Irã, Síria, palestinos e outros que combatem a ocupação da Palestina.
A partir de 2011, a Turquia se tornou uma verdadeira campeã da Primavera Árabe, assustando as monarquias do Golfo ( satélites dos EUA) e Israel, inconformado com a queda do prestimoso Mubarak, do governo do Egito.
Já os povos árabes entusiasmavam-se com o governo turco por ser um dos raros regimes islâmicos democratas.
Pesquisa da TESEV, no início de 2013, revelou que a Turquia era o país mais popular para 78% da população de 16 países do Oriente Médio e do Norte da África.
Bem antes, o governo Erdogan havia iniciado uma nova mudança.
Cortou relações com seu grande amigo, Assad da Síria, em favor dos oposicionistas.
Talvez porque o governo de Damasco fez um acordo com os curdos na Síria, povo que na Turquia, luta por sua independência.
Erdogan começou condenando Assad pelas violências de sua repressão à revolta ora em seu início.
Seu apoio foi ganhando mais consistência até tornar-se um dos mais ativos sustentáculos do exército rebelde, abrindo sua fronteira para passagem de soldados, armas e munições.
No mesmo ano, Erdogan anunciou a instalação de um sistema de radar projetado pelos EUA como parte do escudo contra mísseis partidos do Irã para atacar a Europa.
Lógico que o governo de Teerã não gostou nada das duas iniciativas, já que Assad é seu principal aliado no Oriente Médio.
E aderindo ao escudo americano anti-mísseis,a Turquia estaria formando ao lado de nações que vem o Irã como um perigoso inimigo potencial.
As relações Irã-Turquia esfriaram, congelaram mesmo.
No começo deste ano, Obama convenceu Netanyahu a pedir desculpas à Turquia pela ação letal dos seus comandos contra a flotilha da liberdade.
Faltava pagar uma indenização às famílias dos turcos assassinados. Bibi topou e designou emissários para discutirem o quantum com os turcos.
Aproveitando o momento, o primeiro-ministro Davutoglu informou que as coisas tinham andado muito e o acordo para o restabelecimento das relações do seu país com Telaviv estava próximo. Seu governo praticamente aceitara a proposta israelense de 20 milhões de dólares para as famílias turcas enlutadas .
Foi um erro de cálculo.
O momento era outro, recebido como chefe de Estado em Teerã, Erdogan tinha celebrado importantes acordos econômicos e políticos.
Eufórico, ele afirmara:”O Irã é o meu segundo lar.”
Coerente com esse arroubo, o presidente turco na volta a seu país desmentiu seu primeiro-ministro (a Turquia é presidencialista). Se bem que as negociações de paz com Israel tinham progredido, não estavam sendo concluídas.
Faltava resolver a questão de Gaza.
‘Nada acontecerá se não levantarem o bloqueio de Gaza”, Erdogan assegurou.
Felicidade geral em Teerã, Gaza e Ramala.
A Turquia estava outra vez jogando no seu time.
Agora os EUA vão ter de lidar com a mudança indesejável do seu volúvel aliado.
Claro, sempre será possível fazê-lo voltar aos braços de Tio Sam.
Afinal a Turquia é o emergente em piores condições financeiras.
Numa situação assim, a diplomacia do dólar pode fazer milagres.