Pragmatismo abala luta palestina.

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A estas alturas, Bibi Netanyahu deve estar arrumando as malas. Em 14 de junho, depois de 12 anos dando as cartas em Israel, uma coalisão de adversários deve ser aprovada pelo Parlamento para assumir o poder.

Seu partido e aliados haviam obtido o maior número de cadeiras na última eleição, em 2021, e assim  ele ganhara o direito de formar um governo que contasse com maioria do parlamento.

Não conseguiu.

A bola passou para o centrista Yar Lapid, que uniu toda a oposição ao mal amado Bibi, desde a extrema-direita ao centro-esquerda, enfiando nesse saco de gatos até mesmo um partido árabe.

Para atrair o partido Yamina, de  Naftali Bennett, Lapid aceitou que cada um dos dois líderes liderasse o governo durante um período de 2 anos, cabendo o primeiro a Bennett, quando então Lapid ocuparia o Ministério do Exterior.

Mas se você espera por mudanças que colocarão o barco de Israel no caminho da paz, com a  igualação dos direitos de árabes e judeus, tire esse sorriso do rosto, Bennett é um nacionalista de extrema direita, ainda mais radical do que Bibi.

 Não admite em hipótese alguma a criação de um Estado palestino independente e viável, enquanto seu antecessor aceitava haver um “Estado-vassalo”, formado por diversos bantustões, sem fronteiras contíguas, sujeito ao controle do Estado de Israel.

Os dois defendem a anexação da maior parte da Cisjordânia ocupada. Segundo planos já apresentados por Bibi, os árabes que hoje moram na futura Cisjordânia-israelense acabariam resolvendo ir embora, pois não teriam cidadania, nem os benefícios oferecidos aos cidadãos israelenses, sendo tratados como estrangeiros indesejáveis em sua própria terra.

A grande novidade é que, pela primeira vez um partido árabe, o Islamic United Arab, integrará um governo israelense, como membro da coalisão montada por Lapid.  Antes disso era impensável acontecer algo semelhante pois os palestinos do país eram vistos como inimigos de Israel, votados à sua destruição.

No momento, o apoio dos 4 parlamentares do United Arab é necessário à coalisão Lapid-Bennett para somar os 61 votos exigidos na conquista da maioria parlamentar e, portanto, do governo de Israel. 

Sem os 4 deputados árabes, os oposicionistas não teriam esses 61 votos, não poderiam assumir o poder. E assim Lapid e Bennett tamparam o nariz e admitiram a entrada na coalisão desses parceiros antes tão desprezados.

Nas eleições de 2020, o United Arab fazia parte da Joint List, a união dos partidos árabes,  que  elegeu 15 parlamentares, tornando-se o terceiro partido do país. Mas, nas eleições de 2021, a United Arab ficou fora da Joint List e conquistou as 4 cadeiras, que o tornaram “o fazedor do novo governo”, ao aderir ao bloco contrário à continuidade de Netanyahu.

Desde o início da independência do Estado de Israel, em 1948,  750 mil palestinos foram sendo expulsos do país, perdendo suas terras e lares. Entre os que ficaram, parte habita o Estado de Israel e parte a Cisjordânia, ocupada militarmente pelo exército sionista.

Surgiram então duas classes de palestinos: os habitantes do Estado de Israel, verdadeiros cidadãos de 2ª classe, pois possuem direitos e benefícios inferiores aos gozados pelos cidadãos judaicos e os habitantes da Cisjordânia, sujeitos a draconianas leis militares, típicas de países ocupados por potências estrangeiras. Todos eles podem ser alvo de desapropriações para finalidades militares ou assentamentos; demolições de casas; violentas repressões de  manifestações mesmo pacíficas, não raro resultando em mortes, como nos grandes protesto nas fronteiras de Gaza, quando soldados israelenses usando munição letal, mataram 117 manifestantes palestinos.

Essa situação dramática já dura dezenas de anos, sacrificando ou pelo menos minimizando as chances de centenas de milhares de palestinos terem uma vida normal, levando muitos a desesperadas ações terroristas, aliás, condenáveis pelas vítimas civis e pelos danos à imagem pública da luta palestina por sua auto determinação.

Os palestinos-israelense foram sempre solidários a seus irmãos da Cisjordânia, participando de seus protestos e de suas ações militares, pela criação de um Estado palestino independente e o fim da ocupação da Cisjordânia.

 Com o passar do tempo foi surgindo a ideia de que diante da imensa superioridade militar de Israel e do total apoio americano ao governo sionista a situação na Palestina tendia a se estratificar.

 Essa colocação sensibilizou particularmente os israelenses-palestinos enriquecidos ou que dispunham de uma condição estável trabalhando no comércio, serviços ou profissões intelectuais.

Continuarem ativos ou solidários na luta pelos direitos dos palestinos, principalmente os vulneráveis da Cisjordânia ocupada, poderia ameaçar sua qualidade de vida, sacrificando-a  por uma causa até aqui sem sucesso, além de provocar mais discriminações, acrescidas às já existentes.

Muitos resolveram agir. Ingressaram no United Arab, um partido conservador que vê com bons olhos vantagens na integração palestina na sociedade de Israel.

Não deixam de lamentar sua situação de cidadãos de 2ª classes e de se emocionar com as dores dos seus infelizes irmãos da Cisjordânia ocupada. No entanto, preferem achar que chegou a hora de mudar, já sofreram demais.

Aderem ao United Arab, no preciso momento em que a oposição israelense agarra-se ao partido como a tábua de salvação do seu projeto de tomar o poder. Sentem que, como os judeus anti-Bibi agora dependem deles, estarão dispostos a lhes tratar com a boa vontade até então negada. Que se traduziria em benefícios concretos aos árabes-israelenses, em paga da sua decisiva ajuda.

Mansour Abbas (líder do United Arab, não confundir com Mohamed Abbas, do Fatá) garante que os benefícios  virão.

Seu partido vem pressionando a coalisão anti-Bibi em favor de um volumoso aumento de investimentos públicos nas cidades com maioria árabe, que recebem muito menos do que os judeus israelenses em termos de escolas de qualidade, instalações esportivas, planos de habitação e outras infraestruturas, e no combate ao crime organizado, que assola as comunidades árabe-israelenses pobres.

Também se espera que acabem as desmedidas negações de acesso à terra a membros da sua raça, com a revogação da Lei Kaminitz, que penaliza de modo desproporcional as construções árabes sem licença.

Tudo isso está sendo discutido com os partidos da coalisão oposicionista. Há dúvidas quanto a sua efetivação.

O que parece certo é que o próximo governo, uma vez aprovado pelo parlamento, legalizará 3 aldeias beduínas no deserto do Negev durante seus primeiros 45 dias de mandato, sendo que o United Arab já anunciou um plano de reconhecimento pelo governo de outras aldeias beduínas nos próximos 9 meses (New York Times, 08/o6/2021). São decisões importantes, aprovadas com alívio pela União Europeia, uma vez que apesar dos seus reiterados protestos, o governo Netanyahu vinha há muito tempo destruindo aldeias beduínas implacavelmente.

Na verdade, nada disso está garantido, por depender de um grupo onde o anti-árabe radical Naftalli Bennett pontifica como o próximo primeiro-ministro.

Mansour Abbas informou que o United Arab não pediu nenhum ministério em troca de sua atitude em favor da coalisão anit-Bibi. Contentou-se com cargos de segundo escalão, onde seus membros poderiam prestar bons serviços a Israel, conseguindo assim o respeito de Israel e até reduzir gradualmente as discriminações sofridas por sua raça.

Esta posição ainda é minoritária nos 1.800.000 habitantes palestinos de Israelenses. A grande maioria ainda se nega a hastear a bandeira branca.

Para os contrários ao pragmatismo de Mansour Abbas, não haverá diferenças entre os governos de Bibi e da dupla Lapid-Bennett. Nenhum deles tomará medidas efetivas para reanimar o processo de paz na Palestina.

No passado, foram feitas várias tentativas, jamais bem sucedidas pois Israel nunca aceitou repartir a Palestina com os árabes, já que, pela Bíblia, Deus teria  escolhido o povo judaico para habitar toda a terra entre o rio Jordão e o Mar Mediterrâneo.

Por iniciativa de presidentes americanos, principalmente a partir de Jimmy Carte, realizaram-se muitas démarches inúteis devido às exigências israelenses.

Barack Obama foi quem se esforçou mais. Ele explicou por que desistiu em entrevista à televisão de Israel: “Netanyahu impõe tantas condições [ao acordo], que não é realista pensar que  serão cumpridas num futuro próximo. O perigo é que Israel como um todo perca a credibilidade. A comunidade internacional já não acredita que Israel leve a sério a solução de 2 Estados (JC, 02/06/2016)”.

Nos anos seguintes, as exigências do exigente Netanyahu foram aumentando progressivamente.

Depois que Donald Trump cumulou o regime sionista de benesses verdadeiramente espantosas, Netanyahu sentiu-se fortalecido para elevar suas imposições. Chegou a afirmar que Israel não mais faria concessões, quando,  na verdade, foram os palestinos quem, desde o início, vinha aceitando reduzir suas reivindicações.

Apesar das juras de que sua política externa seria centrada nos direitos humanos, Biden até agora tem se limitado a ser um continuador das políticas pró-Israel de The Donald, que violam esses direitos, entre outras disposições das leis internacionais.

Foi assim que o presidente dos EUA não hesitou em revalidar a anexação israelense do território sírio de Golã, um feito que rasgou o princípio da soberania.

 O reconhecimento de Jerusalém indivisível como capital de Israel, que desrespeitara recomendação em sentido contrário do Conselho de Segurança da ONU, também recebeu seu

Desde o início da independência do Estado de Israel, em 1948, e as guerras de 1967, 750 mil palestinos foram expulsos, perdendo suas terras e lares. Entre os que ficaram, parte habitava o Estado de Israel e parte a Cisjordânia, ocupada militarmente pelo exército sionista.

Surgiram então duas classes de palestinos: os habitantes do Estado de Israel, considerados cidadãos do país, sujeitos a leis civis que lhes garantia direitos, embora inferiores aos dos cidadãos judaicos e os habitantes da Cisjordânia ocupada, sujeitos a draconianas leis militares, típicas de países ocupados por potências estrangeiras.

 Além disso, eram alvos de desapropriações para finalidades militares ou assentamentos; demolições de casas; violentas repressões das suas manifestações de protestos, não raro resultantes em mortes, como na grande manifestação nas fronteiras de Gaza, no qual atiradores israelenses usaram munição letal, matando mais de mil palestinos que protestavam pacificamente.

 Essa situação dramática durou dezenas de anos, sacrificando ou pelo menos reduzindo as chances de centenas de milhares de palestinos terem uma vida normal, levando muitos a desesperadas ações terroristas, aliás condenáveis pelas vítimas civis e pelos danos à imagem pública da luta palestina por sua auto-determinação.

Com o passar do tempo foi crescendo a ideia de que diante da imensa superioridade militar de Israel e do total apoio americano ao governo sionista, a situação na Palestina tendia a se estratificar.

 Esta colocação sensibilizou particularmente os israelenses-palestinos enriquecidos ou que dispunham de uma condição estável no comércio, serviços e profissões intelectuais. Uma postura ativa na luta pelos direitos dos palestinos, principalmente os vulneráveis da Cisjordânia ocupada, poderia ameaçar sua qualidade de vida. Não teria sentido perder tanto por uma causa até aqui inglória.

Muitos resolveram agir. Ingressaram no United Arab, um partido conservador  que, como eles, vê com bons olhos vantagens na integração palestina na sociedade de Israel.

Não deixam de lamentar sua situação de cidadãos de segunda classes e de se emocionar com as dores dos seus infelizes irmãos da Cisjordânia ocupada. No entanto, preferem achar que chegou a hora de mudar, antes que fosse tarde demais.

Aderem ao United Arab, no preciso momento em que a oposição israelense se agarra a ele como a tábua de salvação do seu projeto de assumir o poder. Esses cidadãos de segunda classe sentem que, como agora os judeus anti-Bibi dependem deles, estarão dispostos a lhes tratar com a boa vontade até então negada. Que certamente se traduziria em benefícios concretos, em paga da sua decisiva ajuda.

Mansour Abbas (o lider do United Arab, não confundir com Mohamed Abbas, do Fatá) afirma que o pragmatismo compensa.

Seu partido vem pressionando a coalisão anti-Bibi em favor de um volumoso aumento de investimentos públicos nas cidades com maioria árabe, que recebem muito menos do que os judeus israelenses em termos de escolas de qualidade, instalações esportivas, planos de habitação e outras infraestruturas, e no combate ao crime organizado, que assola as comunidades árabe-israelenses pobres.

Também se espera que acabem as constantes negações de acesso à terra aos membros da raça árabe, com a revogação da Lei Kaminitz, que penaliza de modo desproporcional as construções árabes sem licença.

Tudo isso está sendo discutido com os partidos da coalisão oposicionista. Há dúvidas quanto a seu cumprimento.

O que parece certo é que o próximo governo, uma vez aprovado pelo parlamento, legalizará 3 aldeias beduínas no deserto do Negev durante seus primeiros 45 dias de mandato. E o United Arab já anunciou um plano de reconhecimento de outras aldeias beduínas pelo governo nos seus primeiros 9 meses de trabalho (New York Times, 08/o6/2021).

São medidas aprovadas com alívio pela Europa Unida já que, apesar dos seus muitos protestos, o governo Netanyahu vinha há muito tempo destruindo aldeias beduínas implacavelmente,

Na verdade, nada disso está garantido, por depender de um grupo onde o radical anti-árabe Naftalli Bennett pontifica como o próximo primeiro-ministro.

Mansour Abbas informou que o United Arab não pediu nenhum ministério em troca de sua atitude decisiva em favor da coalisão anit-Bibi. Contentou-se com cargos de segundo escalão, onde seus membros poderiam prestar bons serviços a Israel, ganhando assim o respeito de muitos israelenses e assim até reduzir gradualmente a discriminação sofrida por sua raça.

No entanto, a grande maioria dos cidadãos palestinos israelenses recusa-se a hastear a bandeira branca.

Eles sustentam que não haverá grandes diferenças entre os governos de Bibi- e do duo Lapid-Bennett. Nenhum deles tomará medidas efetivas para reanimar o processo de paz na Palestina.

Já foram feitas várias tentativas, sempre fracassadas, Israel nunca aceitou repartir a Palestina com os árabes, afinal diz a Bíblia que Deus teria  escolhido o povo judaico para habitar as terras entre o rio Jordão e o Mar Mediterrâneo.

Por iniciativa de presidentes americanos, principalmente a partir de Jimmy Carter, os EUA se colocaram como mediadores, supostamente neutros.

Barack Obama foi quem mais insistiu. Ele explicou po rque desistiu, em entrevista à,s televisão de Israel: “Netanyahu impõe tantas condições [a um acordo], que não é realista pensar que  serão cumpridas num futuro próximo. O perigo é que Israel como um todo perca a credibilidade. A comunidade internacional já não acredita que Israel leve a sério a solução de 2 Estados (JC , 02-06-2016)”.

Nos anos seguintes, as exigências do exigente Netanyahu foram aumentando progressivamente.

Depois que Donald Trump cumulou o regime sionista de benesses espantosas, Netanyahu sentiu-se fortalecido a elevar suas imposições. Chegou a afirmar que Israel não mais faria concessões, quando, sempre foram os palestinos, quem desde o início vinham aceitando diminuir suas reivindicações.

Apesar das juras de que sua política externa seria centrada nos  direitos humanos, Biden até agora tem se limitado a ser um continuador do que fez The Donald em favor de Israel, mesmo  violando esses direitos, entre outras disposições das leis internacionais.

Foi assim que o presidente dos EUA não hesitou em revalidar a anexação israelense do território sírio de Golã, feito que renegou o princípio da soberania.

 O reconhecimento de Jerusalém indivisível como capital de Israel, que desrespeitara recomendação em sentido contrário do Conselho de Segurança da ONU, também recebeu seu nihil obstat.

Biden ainda condenou vigorosamente o BDS – movimento de boicote das relações comerciais, contatos científicos, esportivos e artísticos com Israel, criado para forçar o fim da ocupação ilegal da Cisjordânia.

E Joe Biden foi além de Trump nas benemerências ao regime sionista, negando-se a usar os 3,8 bilhões de dólares em armas anualmente concedidos a Israel para influenciar o governo a respeitar os direitos humanos dos palestinos.

Ainda que o presidente democrata tenha defendido a solução dos 2 Estados na crise palestina, não dá para acreditar que ele usaria o peso dos EUA para forçar os novos dirigentes sionistas a aceitarem a criação do Estado palestino, num acordo justo que também garantisse a segurança de Israel.

Lembro que na recente guerra de Gaza, Biden não se cansou de repetir que “Israel tem o direito de se defender”, sem dizer uma única palavra lamentando a morte de dezenas de famílias de Gaza e a destruição de milhares de lares.

Foi o mesmo Biden que, em conversa com jornalistas, considerou que os devastadores ataques de aviões de caça e tanques de guerra contra o estreito de Gaza não fora uma reação exagerada de Bibi.

Sem a improvável intervenção americana, especialmente nos próximos dois anos em que o ultra agressivo Bennett será primeiro-ministro, as relações de Israel com o Hamas e os novos grupos de jovens forjados nos conflitos tendem a piorar. E muito.

Dá para antecipar uma quinta guerra de Gaza, ou pelo menos choques com números consideráveis de vítimas palestinas.

Diante desses eventos previsíveis, o jovem ativista Badri Karam, de 21 anos, pergunta aos árabes integrados no novo governo de Israel:

 “O que vocês farão quando pedirem para que vocês votem no lançamento de uma nova guerra em Gaza?”

 “Aceitarão, serão participantes do assassinato de palestinos?”

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