Depois de 7 meses de discussões que pareciam chegar a lugar algum, uma esperança parece surgir nas negociações palestino-israelenses.
O enviado americano, Martin Indyk, anunciou que uma nova proposta de acordo preliminar do secretário de Estado, John Kerry, seria apresentada em fins deste mês, com boas chances de ser aprovada pelas partes.
Ela versa sobre a questão talvez mais controversa: os assentamentos.
Segundo Indyk, 80% deles seriam anexados a Israel, trocados por terras no deserto israelense de Negev.
Os restantes 20% fariam parte do novo Estado da Palestina, podendo seus ocupantes permanecerem, desde que aceitem se tornarem cidadãos palestinos.
Não foi explicado se continuariam donos das terras dos assentamentos, o que deveria criar um problema, pois Abbas, presidente da Autoridade Palestina, já disse que isso não aconteceria pois assentamentos são ilegais.
Ainda que o representante yankee não esteja pecando por otimismo, mesmo esse princípio de acordo não será aceito facilmente tanto por palestinos, quanto por israelenses.
Os primeiros podem resistir à idéia de trocar terras de boa qualidade, com água e eletricidade, em parte arrebatadas de antigos moradores palestinos, através de recursos, legais ou não – por áreas desérticas, de difícil exploração agrícola.
Por sua vez, os partidos de extrema- direita e religiosos, recusam-se a admitir a entrega de um único metro de terra habitada por judeus a palestinos.
Mesmo que esse obstáculo à paz seja ultrapassado, restam ainda paradas duras a serem resolvidas.
Uma delas, que Kerry gostaria de constar de seu acordo preliminar, é a questão do vale do rio Jordão.
Israel afirma que para garantir sua segurança, ele deve ser controlado por suas tropas.
Os palestinos não aceitam – a Palestina não teria soberania se parte dela fosse dominada por exércitos de um país estrangeiro.
Aliás, que ameaça poderia vir dessa região que faz fronteira com a Jordânia, ao norte da Palestina, no extremo oposto da fronteira com Israel?
Demonstrando boa vontade, Abbas declarou que aceitaria no vale do Jordão o estabelecimento de tropas da OTAN para fiscalizar a passagem. Poderia citar a ONU, seria o lógico, mas preferiu a OTAN, evidentemente para agradar os EUA e a Comunidade Européia.
Não se sabe o que Telaviv diz disso.
O que é notório é o grande mau humor israelense quanto à mediação de John Kerry.
O ministro da Defesa israelense já declarou que os planos do americano não valem o papel com que foram escritos.
E, quando em Davos, o secretário da Defesa advertiu que se as negociações de paz fracassarem, a campanha internacional de boicote a Israel ameaçará seriamente o país, provocou indignação em Telaviv.
Kerry estaria fazendo o jogo dos palestinos.
O ministro da Inteligência, Yuval Steinitz, protestou : “Não se pode esperar que Israel discuta com uma arma apontada na cabeça.” E notou que as observações de Kerry eram contra-producentes em relação aos esforços pela paz porque encorajam os palestinos a endurecer suas exigências.
No entanto, Kerry estava pensando nos interesses de Israel, pois o movimento de boicote e desinvestimento de Israel ( BDS) já vem crescendo muito, vitaminado pela divulgação das contínuas violências e desrespeitos aos direitos dos palestinos praticados pelo governo de Israel, especialmente seu exército.
O mais recente aderente, o PGGM, maior fundo de pensão da Holanda, cortou seus laços com 5 bancos israelenses, num lance que turbinou o BDS.
Conscientes do problema, cerca de 100 líderes empresariais israelenses apelaram, em Davos, para que Netanyahu chegasse a um acordo com os palestinos.
Foram duros: disseram ao primeiro ministro de Israel que, se isso não acontecesse, seu país sofreria um número crescente de sanções internacionais. Não deixaram de lembrar que o movimento pelo boicote e desinvestimento em empresas de Israel estava seguindo o mesmo caminho percorrido na África do Sul.
E deu no que deu.
A reação de Netanyahu a esta situação ainda está para ser clareada.
Sua declaração de que o boicote de Israel era “imoral e injusto” é irrelevante.
Mas a resistência a um entendimento realista com os palestinos é considerável.
Boa parte do ministério, que representa partidos de extrema-direita, não aceita nenhum acordo que sacrifique um único assentamento. Além disso, não admite a cessão de Jerusalém Oriental, a volta de nenhum dos 5 milhões de árabes expulsos na fundação do Estado de Israel e exige que o exército de Israel controle, não só o vale do Jordão, como também o litoral e o espaço aéreo da Palestina.
Por sua vez, a população parece ter absorvido o discurso dos políticos que criticam a ação dos EUA na busca do desejado acordo de paz.
Pesquisa do Geocartography Institute mostra que 70% da população não confia nos esforços de Obama para defender os interesses de Israel nas negociações com os palestinos. 67% apóiam os ataques que seus líderes fazem ao presidente americano e a John Kerry.
67% se dizem preocupados com os riscos do boicote apontados pelo secretário de Defesa americano.
O próprio Netanyahu tem se revelado um intransigente defensor da maioria das posições da extrema-direita.
No entanto, apesar de tudo, ele é um político pragmático.
No começo do seu governo, condenava a teoria dos “2 estados independentes”.
Mudou de idéia por temer a inevitável pressão internacional. Além disso, acreditava que com a contínua expansão dos assentamentos, mais o apoio dos seus lobbies nos EUA, acabaria negociando um acordo totalmente favorável a Israel.
Apesar do otimismo do moderador americano, visualizando uma solução equânime, Netanyahu parece não ter desistido.
Por sua vez, Abbas acredita que já fez muitas concessões.
Difícil esperar que ele vá muito além.
Kerry promete um acordo preliminar, com OK das duas partes, na última semana de fevereiro.
E um acordo definitivo até o fim do ano.
Acredite se quiser.