Antes de ser nomeado embaixador dos EUA em Israel, David Friedman fora advogado e conselheiro pessoal de Donald Trump. Não era das melhores recomendações. Mesmo assim, poderia, quem sabe, ser uma escolha razoável. Infelizmente sua ficha corrida era das mais inadequadas para o posto, que requer alguém imparcial diante do problema palestino e capaz de defender fielmente as posições dos EUA na questão. Coisas que Friedman não era. Longe disso.
Ele sempre esteve na linha de frente dos mais reacionários grupos judeus-americanos. Falcão feroz, defendia a expansão dos assentamentos israelenses na Cisjordânia, que apoiou até com doações. Combatia a “solução dos 2 Estados”, adotada oficialmente pelos EUA e toda a comunidade internacional. Chegou a chamar o então presidente Obama de anti- semita e a comparar os judeus-americanos adversários da ocupação militar da Cisjordânia com os “kapos”- judeus que serviram como guardas nos campos de concentração nazista.
Claro, choveram críticas, inclusive do JSTREET, principal ONG de judeus americanos liberais, que classificou sua nomeação como a pior possível.
Logo se viu que o JSTREET tinha razão.
Pouco depois de assumir seu cargo, o novo embaixador já deu uma demonstração de parcialidade, ao falar em “alegada ocupação militar” dos territórios palestinos, numa insinuação de que essa expressão retratava apenas uma opinião, não um fato.
Mais recentemente, ficou claro que Friedman não pretendia ser, propriamente, um defensor das posições do país que representava. Seria, isso sim, um autêntico embaixador de Israel, ou mais exatamente, das ideias do governo de ultra-direita, liderado por Benjamin Netanyahu.
Em entrevista ao Canal de TV Walla (Haaretz, 28 de setembro), ele afirmou que Israel ocupa apenas 2% do território da Palestina ocupada. O que não passa de uma simples mentira, ou considerando que Friedman é embaixador do país mais poderoso mundo, uma ridícula e estapafúrdia asneira.
Como se sabe, a Palestina ocupada está dividida em três áreas, sendo que a “C”, com 60% do território (a parte mais fértil) é governada por Israel. Mesmo nos 40% restantes, embora a Autoridade Palestina administre a região “A” e controle a segurança da “B”, o exército israelense tem sempre a última palavra. Algo semelhante à situação da zona administrada pelo general Petain, na França sob domínio nazista, durante a 2ª Guerra Mundial.
Além disso: conforme a ONU e diversas ONGs locais, mais de 39% de todas as terras na Palestina ocupada estão sob controle de assentamentos, autoridades locais, conselhos regionais e zonas militares israelenses. Ali, são estritamente proibidas construções e empreendimentos palestinos.
Friedman os novos planos americanos de paz na região estão em andamento, devendo serem apresentados nos próximos meses.
Manifestou sua visão de que todos assentamentos são, de direito, parte de Israel. E que a “solução dos 2 estados” não teria mais sentido.
Bateu de frente com os EUA que, até agora, são contrários aos assentamentos e partidários da solução dos “2 Estados”.
Como o governo de Israel também diverge dessas posições americanas, verificamos que Friedman é muito mais embaixador de Israel do que dos EUA.
Convém também lembrar que este bizarro diplomata contesta até a ONU, cuja resolução 242 do Conselho de Segurança condena os assentamentos e ordena a retirada das forças armadas israelenses dos territórios ocupados, enfatizando a inadmissibilidade da ocupação de um território pela guerra.
Um embaixador que fala contra as posições de seu país, em favor do país para onde foi enviado, é algo inaudito, a rigor poderia até ser considerado traição.
Para quem conhece o passado de Friedman, totalmente devotado à causa de Israel, concebida de forma radical e injusta, não foi surpresa nenhuma.
Trump estava careca de saber quem Friedman era.
O fato de, mesmo, assim o ter nomeado embaixador em Israel, faz temer que seu tão alardeado plano para a crise da Palestina, longe de criar a paz, poderá só alimentar novos conflitos.
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