Que tal Al Capone como monitor de escoteiros?

O que você acha dessa idéia?

E de Severino na Academia Brasileira de Letras?

Ou de Herodes na função de babá?

Aparentemente, o presidente Bush poderia achar certo. Afinal, ele vem nomeando para alguns dos mais importantes cargos do governo pessoas que representam a negação dos objetivos desses mesmos cargos.

A começar por Condoleezza Rice, um dos falcões mais radicais de seu país, levada para a Secretaria de Estado onde, supõe-se, seu dever seria zelar pela segurança e a paz mundiais, buscando sempre dirimir questões pela diplomacia, em harmonia com as instituições internacionais e os países aliados, como bem salientou o presidente americano, recentemente.

Escolha estranha uma vez que a sra. Rice tem se distinguido exatamente pela apologia de coisas como a guerra preventiva, do direito dos Estados Unidos atacarem quem quiserem, sem prestar contas a ninguém.

Seria talvez injusto dizer que Condy é fã de guerras mas é inegável que ela não vacila muito em defender essa opção, como bem demonstrou no caso da invasão injustificada do Iraque.

Depois de escolher para guardiã da paz alguém que não costuma ir muito longe no afã de defendê-la, Bush fez mais uma, digamos, travessura: nomeou Secretário da Justiça Alberto Gonzalez. Ninguém menos adequado.

Como advogado do departamento de Justiça, esse cidadão abriu caminho para a tortura de terroristas presos no exterior, afirmando num parecer que tais práticas se justificavam em função da guerra dos Estados Unidos contra o terrorismo. “A lei penal”, pontificou Gonzalez, “não se aplica à detenção e interrogatório de combatentes inimigos à ordem do presidente, na sua autoridade de comandante em chefe”.

É de Gonzalez a tese de que os suspeitos de terrorismo estrangeiros não tinham direito à proteção da Convenção de Genebra à qual, aliás, ele não dá muito valor. Para Gonzalez, a natureza da guerra ao terror “torna obsoletas as limitações rígidas da Convenção de Genebra no interrogatório de inimigos e esquisitas algumas de suas disposições”.

Deve-se ainda a ele parte do crédito pela disposição da Lei Patriota que cria tribunais militares para julgamentos secretos de suspeitos de terrorismo, algo típico de regimes nazistas. Foi também quem, a pedido da CIA, autorizou por memo ultra-secreto o transporte de prisioneiros para serem interrogados em outros países, onde torturar é normal, o que representa tanto uma violação da Convenção de Genebra, quanto um crime de guerra, pelas leis federais americanas.

Pois foi a este homem que considera “obsoletas” a proibição às torturas que Bush confiou o cargo mais alto do executivo na área da Justiça. Mas surpresa ainda maior o presidente americano causou com sua mais recente nomeação: John Bolton para embaixador dos Estados Unidos na ONU.

Mais do que uma surpresa, foi um choque de muitos megatons. Ocupando importantes cargos no Departamento de Estado durante o primeiro governo Bush, Bolton foi sempre um paladino do unilateralismo. Para ele, a ONU só teria alguma validade enquanto servisse aos interesses dos Estados Unidos. Em caso contrário, não passaria de uma inutilidade, ou pior, um estorvo. São frases de sua autoria: “não existe essa coisa que chamam Nações Unidas” e “se a ONU perder 10 andares não faz diferença”.

Seu total desapreço à entidade supra nacional levou-o a propor que os Estados Unidos deixassem de pagar sua contribuição financeira devida. Também podem ser imputadas a ele ações que sabotaram projetos da ONU.

Vice-secretário de justiça, defendeu a retirada dos EUA da Corte Penal Internacional, à qual ele é contra por princípio pois, imagine o atrevimento, teria direito de julgar cidadãos americanos. Quando anunciou a decisão a Kofi Anam, confidenciou ao Wall Street Journal, “este é momento mais feliz do meu trabalho no governo”.

Quando os inspetores da ONU no Iraque, Mohamed El Baradei e Hans Blix, declararam que as armas de destruição em massa garantidas por Bush não existiam, Bolton fez de tudo para forçar a demissão de ambos dos cargos que ocupavam na entidade internacional, mas não conseguiu.

A idéia de um inimigo da ONU representando os Estados Unidos na própria ONU provocou os indignados protestos de 59 ex-diplomatas americanos, que pediram aos senadores da Comissão de Relações Exteriores a rejeição do nome de Bolton.

Estas três incríveis nomeações de Bush mostram seu autêntico desprezo pelas causas – paz, direitos civis e multilateralismo – que ele diz serem as tônicas da sua segunda gestão. E sinalizam que suas belas palavras, que têm encantado as Polianas e Cândidos de todo o mundo, não passam de ficção.

Escondem a intenção de continuar privilegiando ações bélicas, assim que o Iraque der uma folga. Passar por cima do Bill of Rights, sempre que for útil, mesmo com Jeferson tremendo em sua tumba. E deixar aliados falando sozinhos na ONU, enquanto Bush resolve tudo sozinho.

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