Israel ameaça a maior esperança de acordo na Síria.

Netanyahu viu com péssimos olhos o cessar-fogo e a zona de segurança negociados entre Rússia e EUA.

Para aceitar o acordo, fez uma série de exigências.

As principais: as forças do Hisbolá não poderiam ficar no sul da Síria, o Irã não poderia consolidar sua posição nessa região e a Rússia não poderia patrulhar as zonas de segurança junto à fronteira Síria-Israel.

Nada disso foi aceito pelas duas grandes potências.

O cessar fogo, com criação de zonas de segurança, representa certamente a negociação mais bem susedidas entre Moscou e Washington durante a guerra.

É talvez o primeiro passos para se chegar a uma paz total. Ou, pelo menos, a um cessar-fogo duradouro.

Aplacar Israel não é aceitável. Sendo suas pretensões atendidas, iriam para o espaço as esperanças de se pôr um ponto final no terrível morticínio desta guerra.

Sem contar que Telaviv nem sequer está envolvida no conflito, não é parte legítima nas negociações de um acordo de paz. Netanyahu negou que suas forças militares tenham lançado qualquer ataque contra o lado de Assad.

O que o primeiro-ministro desmentiu, numa reunião fechada. Fechada pero no mucho.

Bibi deixou vazar para reporteres que a aviação de Israel já atacara dezenas de vezes objetivos iranianos em território sírio (Jerusalem Post, 19 de julho).

Isso não poderia ser contado às claras, diante das negativas oficiais de Netanyahu.

Com os vazamentos, provou-se que ele mentira, algo indigno do chefe do governo de um país. Aparentemente, Netanyahu não dá muita bola para esses pruridos éticos.

O General Yaakov Amidrov, muito próximo do premier, foi mais longe.

Afirmou que caso Rússia e EUA não atendam às queixas de Israel, seu país vai destruir qualquer tentativa de construção de infraestruturas militares pelos iranianos. Israel jamais permitiria que o Irã e seu aliado, o Hisbolá, vencessem a guerra da Síria, concluiu o belicoso general (Haaretz, 20 de julho).

Esta ameaça se identifica com repetidos comentários de outros oficiais muito estrelados. Para eles, Israel preferiria que o ISIS ganhasse controle sobre a Síria do que o Irã, tido sempre como o “principal inimigo (Haaretz, 20 de julho). “

Não há dúvida de que Irã é um inimigo de Israel como a Rússia é dos EUA (conforme os generais do Pentágono e os políticos americanos de direita).

Mas daí concluir que os EUA estão à beira de serem atacados por Moscou, a conversa é muito outra.

Evidentemente o Irã deseja o fim do regime sionista de Israel.

Mas, nem os moderados do governo Rouhani, nem os reformistas que estão a seu lado, falam em atacar os israelenses militarmente.

Os políticos de Telaviv se apegam às ameaças antigas do então presidente Ahmadinejad de “varrer o regime sionista do mapa”. É fato que o iraniano desidratou suas palavras, explicando que, na verdade, havia dito: ‘Assim como o regime soviético desapareceu, o regime sionista sumirá e a humanidade será libertada. ”

Mesmo se atendo à versão agressiva, lembro que aconteceu em 2005.

O Irã mudou muito nesse período.

O moderado Rouhani assumiu em 2013 e mudou a postura furiosa do seu regime contra o regime israelense.

Agora, o Irã aposta que a pressão dos palestinos e dos países árabes acabará por forçar a mudança, o fim do regime sionista, tornando Israel um país aberto, no qual judeus, muçulmanos e cristãos teriam os mesmos direitos, inclusive eleitorais.

A última, digamos, agressão verbal, partiu do linha dura Khamenei, o Supremo Líder, por sinal adversário de Rouhani

Era 2015, ano em que israelenses e iranianos trocavam ameaças raivosas de ataques.

Foi quando Khamenei, vaticinou o desaparecimento do regime sionista em Israel: “ Eu diria (a Israel) que eles não verão (o fim) nesses 25 anos. ”

Se o Supremo Líder dá um prazo de quarto de século para a sobrevivência do regime sionista, parece  que, pelo menos até os últimos anos desse período, os iranianos  linha dura deixarão Netanyahu e seus sucessores dormirem tranquilos.

Acho que acusar Teerã de pretender acabar com o Estado sionista à força, a qualquer momento, é uma ideia furada.

Na verdade, o governo de extrema direita de Bibi Netanyahu não admite que qualquer país do Oriente Médio possa se fortalecer a ponto de construir um exército quase tão poderoso quanto o de Israel. Vide o recente protesto de Telaviv aos EUA por estarem vendendo armas em quantidade à Arábia Saudita, que não é, propriamente, uma nação hostil ao Estado de Israel, ainda mais porque sauditas e israelenses gravitam em torno dos EUA. Sem contar que o rei Salman tem orticária só de ouvir falar no Irã- o grande inimigo das duas nações.

O imperativo de impedir o crescimento do poder militar alheio não deixa de ser paranoico, pois nem o Irã, nem outro país do Oriente Médio, é páreo para as forças armadas de Telaviv.

Israel recebe cada ano 3,1 bilhões de dólares dos EUA em armamentos estado de arte. E, o que pesa definitivamente, tem 200 bombas nucleares.

No entanto, defender-se do Irã é um objetivo tão absoluto que o governo de Telaviv chega à ameaça  de sabotar o cessar-fogo e a zona de segurança russo-americanos. Poderá conseguir, se atacar, como alardeia, bases do Irã e do Hisbolá no sul da Síria. Isso provocaria retaliações russas e enterraria um acordo que traz a primeira esperança real de paz na catástrofe humana que assola a Síria. E que iria interromper o tristíssimo drama dos muitos milhares de imigrantes que fogem para a Europa, em busca da vida, que lhes escapa na sua terra. Hoje, milhões deles já emigraram, causando sérias dificuldades aos países do velho continente, sem condições de acolhe-los.

O ódio e o temor exagerado ao Irã provocam reações chocantes em Israel.

Para muitos oficiais militares é preferível que o ISIS controle a Síria do que o Irã.

Postura irracional e tola.

Colocar os interesses pouco válidos de Israel na frente dos interesses da humanidade, sujeita aos atentados bárbaros e sucessivos do ISIS,  é muito grave.

Lembro ainda que os louros de uma eventual vitória na guerra não serão do Irã.

Caso aconteça como um desdobramento do processo de cessar-fogo e das zonas de segurança, seriam EUA e Rússia que iriam organizar o novo regime sírio, cabendo, u papel apenas secundário aos iranianos, compartilhado com outros atores do conflito, como a França, o Reino Unido, a Arábia Saudita e a Turquia.

Lembro ainda que há muitos anos a Síria vive em paz com Israel, com quem partilha um largo trecho de fronteira.

Em todo esse tempo, o Irã era um grande aliado do regime Assad, sem que essa parceria trouxesse problemas significativos para a segurança da Israel.

Talvez fosse demais esperar consciência crítica do governo ultra-direitista de Netanyahu.

Mas a comunidade internacional espera que os EUA e a Rússia o segurem.

Antes que seja tarde.

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