No início de setembro, Mahmoud Abbas, presidente da Autoridade Palestina anunciou que preparava uma surpresa na Assembléia Geral da ONU. Seria uma autêntica bomba.
Nem por isso a comunidade internacional ficou preocupada.
Ao procurar John Kerry esperando propostas para novas negociações de paz, Abbas recebeu em troca algo semelhante a um bocejo. O secretário de Defesa não tinha nada a dizer.
Logo em seguida, discursando no início da Assembléia Geral da ONU, o presidente Obama posicionou-se sobre os principais conflitos internacionais – mas ignorou o da Palestina.
E ao mesmo tempo, os EUA votaram contra o hasteamento da bandeira da Palestina na sede da ONU. Somente 8 nações os acompanharam, entre 193 outras a favor da bandeira.
Abbas cumpriu sua promessa.
Declarou na ONU que a Palestina estava se desligando do Acordo de Oslo, já que Israel não vinha cumprindo suas cláusulas sistematicamente.
Citou a expansão dos assentamentos na Margem Oeste da Palestina (a Cisjordânia) e a negativa em libertar os prisioneiros políticos palestinos como exemplos.
O ora extinto Acordo de Oslo, assinado por líderes israelenses e palestinos em 1993, estabelecia basicamente :
- Independência da Palestina em 1999, com garantias de segurança para Israel, através de uma série de etapas;
- Enquanto isso não saia, divisão da Cisjordânia em três partes: área C com 63% da superfície total da Cisjordânia com administração e segurança por Israel: área B com administração palestina e segurança a cargo de Israel e área A, com administração e segurança a cargo de uma nova entidade – a Autoridade Palestina.
Para alguns observadores, a bomba do líder palestino não passava de uma bombinha de São João.
Diziam eles que a declaração de Abbas significará pouco em termos práticos. Para ser um estouro, teria de prever o fim da colaboração da polícia palestina com o exército de Israel e o abandono da solução dos dois-Estados.
Acho muito discutível.
A solução dos dois Estados continua sendo a única racional, só os palestinos (e judeus) mais radicais não a aceitam.
Acredito que para a bomba de Abbas tirar os estadistas de sua zona de conforto, a polícia palestina precisa mesmo parar de colaborar com os órgãos policiais israelenses.
Parece ser o que Abbas pretende.
No seu discurso, afirma que, com o fim do Acordo de Oslo, caberá a Israel assumir todas as responsabilidades de “poder ocupante”.
E quais são elas?
De acordo com o Comitê Internacional da Cruz Vermelha: manter a ordem pública, providenciar alimentação e cuidados médicos à população, garantir a saúde pública e facilitar o trabalho das entidades educacionais entre outras obrigações.
Até agora, estas atividades vinham em grande parte sendo pagas por doações internacionais à Autoridade Palestina.
Passando a administração dos territórios palestinos para o exército de Israel, não vejo porque os doadores – países árabes e europeus – iriam continuar mandando seu dinheiro.
Por sua vez, a perda da colaboração da polícia palestina seria muito sentida pelas forças armadas de Israel.
De uma hora para outra ficariam obrigadas a montar todo um aparelho de segurança nas áreas hoje administradas por Abbas. E envolver-se em mais conflitos com o habitual efeito colateral de mortes de manifestantes, rebaixando cada vez mais a imagem internacional do país.
Tudo isto custaria muito dinheiro e perdas políticas ainda maiores para Israel.
Também há quem menospreze a saída de Oslo, dizendo que falta algo de essencial: o fechamento da Autoridade Palestina como entidade administradora de 40% do território da Cisjordânia.
Alguns dizem que isso jamais acontecerá pois, para Abbas e seu grupo implicaria na perda de muitos cargos, poder político e das ricas doações das potências árabes e européias.
É um argumento ponderável.
No entanto, acho bizarro a Autoridade Palestina continuar administrando as áreas A e B da Cisjordânia depois do seu líder retirar-se do Acordo de Oslo que lhe atribuiu essa responsabilidade.
Seja como for, no discurso de ruptura, Abbas pede o reconhecimento da Palestina independente como membro completo da ONU.
E faz uma proposta radical: substituir as negociações bilaterais com Israel, até agora item essencial de todas as iniciativas de paz, por uma intervenção da ONU.
Ele reforça essa idéia, pedindo a proteção da ONU para seu povo obter a desejada independência.
De acordo com o velho dito inglês, It Takes Two To Tango (é preciso dois para dançar o tango). Depois de 22 anos de negociações bilaterais frustradas, ficou absolutamente claro que Israel não aceita uma Palestina independente.
Abbas custou mas,por fim, parou de dar murro em ponta de faca, e resolveu apelar para que a ONU assumisse a questão.
Afinal, foi para resolver conflitos entre países que a ONU foi fundada.
Se a idéia é lógica, nem por isso fará Netanyahu feliz.
A causa dos palestinos é absolutamente justa.
Nenhum país pode ocupar militarmente outro por largos espaços de tempo. E ainda por cima tomar terras do seu povo como Israel faz através dos assentamentos judaicos na Cisjordânia.
A Palestina tem todo o direito de ser independente e reconhecida como membro integral da ONU.
A França já votou pelo reconhecimento no ano passado. Em 2015, o parlamento do Reino Unido exigiu que o governo Cameron fizesse o mesmo. A opinião pública alemã apóia a independência palestina e Ângela Merkel deve embarcar nessa onda. A Rússia e a China, nem se discute.
No time de Netanyahu deverão ficar apenas algumas ilhas do Oceano Pacífico, o Canadá, talvez a Austrália…
Mas, e os EUA?
Com o veto deles, nada feito.
Obama já deu os maiores sinais que, desta vez, vai pensar bem antes de dizer amen a Israel.
Mas será que, depois da sua árdua luta pelo acordo nuclear com o Irã, terá coragem de enfrentar novamente Israel, seus lobbies nos EUA, o Partido Republicano, além dos democratas do Israel first?
Está em jogo a proclamação de independência da política externa americana.
Eça,só oito em 201 é incrível! O Obama não tem jeito mesmo.
Desculpe a pobreza do meu comentário, mas meu conhecimento sobre o assunto é marcante. Só sei o que você me conta.
Abraço