Porque Israel quer calar Bargouthi.

A primeira reação à mensagem de Marwan Bargouthi concitando os palestinos à resistência civil e à não-violência veio de Israel.

Bargouthi foi castigado com uma semana de confinamento solitário no cárcere onde ele cumpre pena de prisão perpétua.

À primeira vista esta atitude do governo israelense parece incoerente.

Afinal, Bargouthi apelou para o fim dos atentados e do lançamento de mísseis em Israel.

E, como Bargouthi é muito respeitado por todos os movimentos de libertação, sua mensagem tem muitas chances de ser obedecida. O que viria trazer para o povo de Israel uma segurança e tranqüilidade que jamais teve.

E para Netanyahu também, pois isso é teoricamente o principal objetivo do seu governo.

Portanto, a punição sofrida por Bargouthi parece absolutamente ilógica.

Analisando o assunto, você vai concluir que não é bem assim.

Atualmente, a Autoridade Palestina mantém alguma colaboração com as autoridades de ocupação israelense, especialmente na área da segurança.

O trabalho dos policiais palestinos, treinados pelos americanos, tem ajudado os serviços de segurança israelenses a prevenir ataques nas regiões ocupadas, nos assentamentos e no território de Israel.

Além disso, a Autoridade Palestina tem se prestado a acalmar os ânimos do seu povo diante das violências praticadas pelo exército e pelos habitantes dos assentamentos.

Para Bargouthi deve cessar toda e qualquer cooperação com Israel e assentamentos. Mesmo em eventuais trabalhos em conjunto.

Bargouthi prega a resistência civil através de manifestações de protesto, passeatas e denúncias. Mais do que isso: resistência civil significa não cumprir leis ou decisões governamentais injustas. Como Gandhi pregava e fazia.

Recusando-se a cooperar com Israel e a cumprir decisões injustas, a Autoridade Palestina acabaria sendo um espinho no corpo da nação judaica.

Jamais seria aceita pelo governo Netanyahu que forçosamente demitiria o presidente da entidade palestina ou simplesmente determinaria seu fechamento.

Qualquer dessas medidas causaria condenações da ONU e da opinião pública mundial.

Bargouthi prega também um boicote dos produtos e serviços de Israel e dos assentamentos.

A idéia desse boicote deveria ser promovida em todo o mundo.

Já existe uma campanha assim há alguns anos. Que ficaria mais forte quando se tornasse uma política oficial dos movimentos palestinos.

Não é preciso dizer que as empresas de Israel e dos assentamentos, além do governo, não aplaudiriam essa campanha.

Talvez o que enfureça mais Netanyahu nas idéias propostas por Bargouthi seja sua negação do processo de paz.

O líder palestino propõe que seja comunicado oficialmente que o processo de paz está extinto.

Ora, apelar para esse processo, que existe há 20 anos sem nenhum resultado, tem sido o grande lance de Israel e seu bom amigo, os EUA, para garantir que as coisas continuem como estão.

Obama condenou e fez campanha contra a declaração de independência da Palestina pelo Conselho de Segurança da ONU, alegando que iria impedir o processo de paz.

Pelo mesmo motivo, seus acólitos no Conselho de Direitos Humanos da ONU vem tentando barrar todas as iniciativas para condenar as inúmeras violações praticadas por Israel; para exigir o desbloqueio de Gaza; para a Palestina ingressar na Unesco.

Para acelerar o processo de paz, Tony Blair, representante do Quarteto (EUA, ONU, Rússia e Reino Unido), tem feito caríssimas viagens de turismo ao Oriente Médio.

Acabando o processo de paz,  Obama, seus seguidores europeus e o governo Netanyahu ficam sem desculpas para impedirem a independência da Palestina.

E esse “terrorista”, Bargouthi, já preconiza uma cilada para deixar os Grandes do Ocidente e Israel em cheque.

Ele propõe renovar-se a batalha pelo reconhecimento de Israel no Conselho de Segurança da ONU.

Claro, mesmo sem processo de paz, Obama vai inventar alguma desculpa para vetar. Depois disso, os palestinos deveriam recorrer à Assembléia Geral, onde sua vitória é certa por larga margem.

Com isso Israel e os EUA ficariam isolados. Enquanto que a maior parte das nações do mundo ficariam ao lado dos palestinos.

Isso criaria enormes problemas par os EUA com seus aliados árabes: a Arábia Saudita, o Qatar, o Bahrein, o Yemen, a Jordânia, o Marrocos,  entre outros.

Mesmo os países muçulmanos não-árabes iriam ficar indignados com os americanos.

A imagem internacional de Israel iria para o espaço, o que viria por fogo na campanha do boicote em todos os países do mundo.

Bargouthi insiste também na união entre Fatá e Hamas, para dar mais força ao movimento palestino de libertação.

Mau negócio para Netanyahu.

Por fim, temos a não-violência, que Bargouthi defendeu em reunião com jornalistas de Israel. Para ele, trata-se de um ponto básico na nova política palestina.

Se os palestinos conseguirem se conter e não reagir às violências dos serviços de segurança e do exército de Israel, sua imagem externa vai crescer muito.

E Obama, Cameron e Merkel não terão como continuar taxando o Hamas de terrorista.

Finalmente, Bargouthi declara-se favorável à solução dos 2 estados, nos limites de 1967. Portanto, reconhece Israel. E, como também defende a não-violência, caso o Hamas aceite sua proposta, Israel ficará sem motivos para negar-se a reconhecê-lo.

Levando em conta todos esses aspectos, a mensagem de Bargouthi aos palestinos é mesmo fundamentalmente contrária à política do governo Netanyahu.

O quer não quer dizer que seja contrária aos interesses de Israel.

Há muitos políticos israelenses favoráveis ao perdão para ele.

Simon Peres declarou que caso fosse eleito presidente, o indultaria. O que não aconteceu.

Quem é a favor da solução dos 2 estados, certamente prefere Bargouthi em liberdade.

A posição de Bargouthi contra o processo de paz é porque esse tema tem sido usado exatamente para negar sua efetivação.

Um governo israelense favorável aos 2 estados, nos limites de 1967, à divisão de Jerusalem entre árabes e judeus e a uma solução para o problema dos palestinos expulsos, teria o apoio de Bargouthi.

Como o governo atual não é assim, resta aos palestinos a resistência civil e a não-violência para conseguirem sua libertação.

Muita gente duvida.

Gandhi e Mandela provaram que pode dar certo.

 

Um comentário em “Porque Israel quer calar Bargouthi.

  1. Bargouth é um espinho cravado em muitas gargantas.
    Em última hora anuncia-se que se prepara mais uma possível reunião de “negociações para a paz” entre Netanyahu e Abbas…
    Tão pressurosos que ficaram… de repente…

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