Mais da metade das mortes no atentado de 11 de setembro foi causada em parte pela negligência ou cupidez de grupos americanos envolvidos na construção das Torres Gêmeas. É o que afirmam Jim Dwyer e Kevin Flynn, jornalistas do New York Times, em “102 minutos – a história inédita da luta pela vida nas Torres Gêmeas”. Segundo eles, muitas das pessoas morreram devido a graves falhas no projeto de construção das torres.
No início da década de 60, a parte baixa da ilha de Manhattan achava-se em plena decadência. Neste ano, o Chase Manhattan Bank , da família Rockfeller, abriu uma sede no local. Para revitalizar a área, David Rockfeller, vice-presidente do banco, planejou um “centro de comércio mundial”, de proporções grandiosas. A administração do Porto de New York – agência estatal sob controle dos governos de New Jersey e New York – associou-se à idéia, assumindo sua construção. Registre-se que o governador do estado de New York era Nelson Rockfeller, irmão de David.
Na época, o sindicato da construção civil e dos interesses imobiliários fazia um ativo lobby para a modificação do código de obras vigente, considerando que sua preocupação com segurança seria excessiva e desnecessária. Propunha abrandar ou substituir as especificações exigidas nas obras, com o fim de proporcionar redução dos custos e assim permitir maiores lucros e diminuir o tamanho das áreas de segurança, aumentando-se o espaço rentável dos imóveis. Em suma: priorização da lucratividade em lugar da segurança.
Tudo isso foi feito no novo código, elaborado por encomenda da indústria da construção civil e oficializado em dezembro de 1968. Já em 1965, em fase de rascunho, ele fora apresentado à administração do Porto de New York, que decidiu construir o World Trade Center de acordo com suas normas, embora ainda não tivessem sido aprovadas. Isso era permitido, pois a administração do Porto de New York não estaria sujeita a códigos de obras municipais. Explicando essa opção por leis ainda não oficializadas, disse Harold Birns, chefe do Departamento de Edificações da cidade: “Nosso código atual protege a segurança e o bem-estar da população, mas certamente não permite toda a eficiência e a economia que a indústria e as empresas consideram necessárias”. Mais claro, impossível.
Em “102 minutos”, Dwyer e Flynn listam algumas das mudanças conseguidas pela indústria da construção civil.
Enquanto o código antigo exigia nas paredes um tipo de alvenaria específico para resistir ao fogo, o código novo aceita qualquer material que resista apenas algumas horas.
Enquanto as colunas dos edifícios altos tinham de ser construídas para agüentar 4 horas de fogo, agora bastam 3. Nos pisos, a resistência exigida passou de 3 a 2 horas, dispensando-se o revestimento de concreto para proteger o aço estrutural contra o fogo, antes obrigatório.
Foram suprimidas as torres com escadas fechadas de incêndio. Reduzidas de 6 para 3 o número de escadas para prédios altos como o World Trade Center. Reduzida também sua proteção: o tempo mínimo de resistência ao fogo das paredes em volta dos poços passou de 3 para 2 horas, sendo liberada sua construção com material muito menos resistente.
No código antigo, as saídas de cada andar tinham de ser distantes uma das outras para que um problema numa delas não obstruísse também as outras. O novo código, ambiguamente, contenta-se com saídas tão distantes uma das outras quanto possível.
Vincent Dunn, analista de práticas de segurança contra incêndio e ex-comandante do corpo de bombeiros de New York, em 1995, na revista “Fire Egineering”, comentou o novo código assim: “Depois de lutar contra incêndios em edifícios altos no centro de Manhatan, nos últimos 10 anos, minha opinião é que o Corpo de Bombeiros tem tido sorte”.
Essa sorte acabou em 11 de setembro de 2001 quando os resultados da opção pela lucratividade em detrimento da segurança apareceram no atentado ao World Trade Center.
Dos 2.749 mortos, 1.500 pelo menos teriam sobrevivido à destruição causada pelo impacto dos aviões, vitimados por não conseguiram fugir do incêndio dele decorrente antes das torres caírem. E isso aconteceu principalmente devido às falhas de segurança do projeto de construção resultantes da liberalidade do novo código de obras de 1968.
Estas conclusões se baseiam em depoimentos de profissionais, instituições técnicas e centenas de sobreviventes e bombeiros. Dwyer e Flynn reportam uma série de fatos que relacionam mortes em massa às mudanças no código, alguns citados a seguir.
Como as escadas não tinham portas duplas que impediriam a entrada da fumaça tóxica e do próprio fogo, muitas pessoas não puderam usar a única escada que lhes permitiria a salvação.
Não sendo mais obrigatórios revestimentos de alvenaria refratários ao fogo para proteger a estrutura de aço, o World Trade Center usou um preparado com fibra de asbetos pulverizado sobre paredes e juntas. Isso não conteve o fogo, que envolveu os revestimentos, alimentando-se dos materiais altamente inflamáveis de madeira e plástico com que eram feitos, o que expandiu enormemente o incêndio.
Estudo do “United States National Standards of Technology” aponta o uso insuficiente de materiais refratários a fogo e a falta de escadas como causas de muitas das mortes.
Não se pode diminuir a culpa dos bárbaros autores do atentado contra as Torres Gêmeas. No entanto, “102 minutos” mostra que grupos americanos ajudaram indiretamente a potencializar os efeitos brutais da sua ação. Provavelmente, esses colaboradores jamais imaginariam o que poderia acontecer. Estavam cegos para qualquer outra coisa que não fosse os lucros a mais que visavam.