Comentando a inauguração do Centro Global de Combate ao Terrorismo criado pela Arábia Saudita, o Conservative News disse na edição de 29 de maio: ”Nem um único comentarista considerou, nem mesmo por um minuto, que isto poderia significar uma importante mudança e potencialmente uma real contribuição à guerra ideológica, proposta por Trump.”
Bem, talvez nos EUA, no Brasil foi diferente.
Nossa grande mídia saudou a iniciativa saudita, por sua “grande importância no panorama da luta anti- terrorista. ”
Fico com o texto do Conservative, que relaciona o Centro a uma ideia saudita para convencer a opinião pública mundial das nobres intenções do governo de Riad. Do desejo de colocar seus bilhões de dólares para livrar o mundo da praga do jihadismo radical – representado pelo Estado islâmico, a al Qaeda e outras ameaças similares ao bem estar da humanidade.
Difícil de acreditar pois até os americanos médios estão começando a tomar consciência do que os sauditas estão fazendo no Iêmen.
A guerra que os sauditas e aliados estão travando é para repor o presidente Hadi no governo, deposto por uma revolução do movimento Houthi.
É bom explicar que Hadi, um fantoche de Riad, permanecia governando dois anos depois do fim do seu mandato.
A Arábia Saudita organizou uma coalisão, com sete países receptores de seus empréstimos, para atacar os adversários de forma implacável, bloqueando seus portos e bombardeando seu povo.
Mais de dois anos já passaram e os houthis ainda resistem, apesar das avançadas arma americanas usadas pelos sauditas.
VVeja só algumas consequências das ações militares do governo de Riad.
De 8 10 mil mortos houthis, a maioria civis.
17 milhões de pessoas sofrendo com a escassez de alimentos, dos quais 80% são importados; perto de 7 milhões de famílias a um passo da fome generalizada.
Desde abril, uma epidemia de cólera matou 500 iemenitas, sendo que 55 mil já se acham infectados (1/3 são crianças). A ONU prevê 150 mil casos novos para os próximos seis meses, sendo que 10 mil devem morrer, 20 em média, por dia.
Relatório da UNICEF indica que 400 mil crianças sofrem de grave e aguda má nutrição. Calcula-se que, em média, morrerá uma criança a cada 10 minutos, de má nutrição, diarreia e infeções do trato respiratório.
Graças à guerra saudita boa parte do país ficou desorganizado, sem lei, nem justiça. E os houthis, temidos por seus inimigos da al Qaeda, foram obrigados a concentrar suas forças para defender o país contra o reino, deixando em paz os herdeiros de Bin Laden
Aproveitaram-se disso e da situação anárquica do país para aumentar seu espaço, sem que a Arábia Saudita se incomodasse. O que interessa à monarquia é acabar com os houthis.
Como a fome e as doenças avançam cada vez mais rápido, vitimando principalmente as crianças, e a ONU já condenou os sauditas várias vezes por suas malazartes no Iêmen, a humanidade está tomando consciência das barbaridades dos reis do petróleo. O que pode obrigar os governos do Ocidente a tomar uma atitude: protestar, exigir respeito aos direitos humanos, coisas que deixariam o rei e seus inúmeros príncipes bastante alarmados.
Daí procurarem se mostrar ardentes adversários dos bárbaros do Estado Islâmico e da al Qaeda.
Construiram um Centro contra o terrorismo que, pelas fotos, parece ser uma beleza.
Mesmo assim a credibilidade do reino deve continuar profundamente discutível.
Afinal, o passado (e até o presente) os condena.
Veja só como esses soi disant inimigos do terror vem se comportando, digamos, nos últimos 20 anos,
Vou dar a palavra ao próprio Donald Trump.
Em 2011, ele declarou, “O regime saudita, o maior financiador do terrorismo mundial…usa o nosso próprio dinheiro para financiar o terrorismo.”
E Hillary Clinton, quando secretária de Estado de Obama graças a documento revelado pelo Wikileaks, deixou claro que: “A Arábia Saudita continua uma base de apoio e do financiamento à al Qaeda, ao Talibã e á Le T.”
Isso foi há até seis anos, diria Trump, agora Riad cria organizações com edifícios moderníssimos para destruir a ideologia dos discípulos de Bagdadi e do extinto bin Ladem.
É uma nação exemplar.
Vai ver, a Arábia Saudita mudou.
Não parece.
Em 20-9-2014, The Donald tuitou: ”A Arábia Saudita já está pagando o ISIS.”
Dois anos depois, no ano passado, ele ainda condenava o reino. Foi quando Obama relutava em revelar as 28 páginas sigilosas sobre o atentado de 9-11. Trump clamou: “Quem explodiu as Torres Gêmeas? Não foram os iraquianos, foram os sauditas- deêm uma olhada na Arábia Saudita, abram os documentos (The Intercept).”
Eis que, subitamente, Trump passou a ver os sauditas com bons olhos.
Não, não foi pelo que você está pensando.
Veja o que ele conta: ”Eles estão comprando apartamentos e propriedades de mim. Gastam 40 a 50 milhões. Você espera que eu os odeie? Eu os amo muito! (Antiwar, 2-2-2017).”
Você tem de admitir que tornar Trump mais rico não muda nada, não transforma os sauditas em anjos. Erguem maravilhas arquitetônicas para combater a ideologia dos terroristas, mas continuam apoiando as hostes assassinas do Estado Islâmico.
Financiadas por Riad, as madras (escolas islâmicas), que se espalham pelo mundo, incutem nos jovens alunos as ideias wahabitas, doutrina oficial da Arábia Saudita, praticamente um ramo dos salafismo, este, a mais radical seita islâmica. De lá saem a maioria dos jovens inclinados a matar infiéis e os que consideram hereges, segundo seu islamismo distorcido. Certos de que, caso sacrifiquem suas vidas em atentados suicidas ou guerras, o paraíso é seu destino.
Deixem a Arábia Saudita fora disso, diria Rex Tillerson, ela mudou, passou a combater o terrorismo e sua nefasta ideologia. E, com mais eficiência, agora que ergueu um magnífico edifício, onde se reunirão as nações “do bem,” para discutir suas estratégias anti-terroristas.
Falando sério, isso dificilmente acontecerá.
Quem se reunirá ali deverão ser turistas para admirarem a arquitetura state of art do projeto saudita.