Irã nuclear: o acordo ainda é possível?

O copo está meio vazio ou meio cheio?

Foi a dúvida que ficou depois da última reunião nuclear entre o Irã e o P5+1.

Como não se chegou a resultado algum, a primeira opção parece a mais correta.

Para Israel, não exatamente.

Seus líderes defendem uma terceira opção, esta, sim, a melhor: tendo fracassado mais uma reunião, o copo ficou totalmente vazio.

Portanto, é hora de fechar a janela para a diplomacia e partir para soluções definitivas.

Clamou o ministro de Assuntos Estratégicos, Yuval Steinitz: “Israel já avisou que os iranianos estão explorando as reuniões para ganhar tempo, enquanto refinam seu programa atômico. Israel acredita que sem uma significativa e tangível ameaça, incluindo com prazo curto, está claro que conseguir o desmantelamento do projeto nuclear não será possível.”

Que venha um ultimato dos EUA e nações ocidentais: ou o Irã abandona seu programa nuclear em poucas semanas, no máximo num mês, ou chumbo nele!

Alguns apressados observadores concluíram que a hora do Irã tinha chegado.

Houve mesmo quem prognosticasse para junho um ataque israelense e/ou americano.

Afinal, na sua triunfal e amorosa visita a Israel, Obama já dera sinal verde para Netanyahu satisfazer seus intentos beligerantes.

Mas o secretário de Estado, John Kerry, em Istambul, jogou água fria nessa ideia.

Declarou que, embora nada tivesse evoluído na reunião de Almaty, era importante continuar negociando, em busca de um terreno comum.

“Diplomacia é um ofício penoso”, filosofou.

Em outras palavras, a janela continua aberta.

Por sua vez, lady Catherine Ashton- chefe de Relações Exteriores da Europa Unida- achou que houve um certo progresso, as discussões se tornaram mais francas e objetivas.

Embora as posições das partes continuassem distantes.

Os EUA e as potências europeias querem que o Irã pare com o enriquecimento de urânio a 40%, chegando apenas a algo abaixo de 20%, e entregue seu estoque desse material, ficando com uma pequena quantidade para suas necessidades.

Em troca, oferecem um alívio bastante limitado nas sanções. E a promessa de futuras reduções em reuniões posteriores, caso Teerã cumpra o estabelecido.

O representante do Irã não precisou pensar muito para dar seu obstat.

Alegou que pelo Tratado de Não- Proliferação Nuclear, o Irã tem todo o direito de enriquecer urânio. O que é verdade.

Isso seria necessário para poder produzir isótopos usados pela medicina no tratamento de cerca de 1 milhão de doentes.

Para segurança do Ocidente e seu protegé, Israel, os fiscais do IAEA (Agência Internacional de Energia Atômica, da ONU) vinham controlando estreitamente os estoques de urânio enriquecido a 40%.

E podiam atestar que todos os volumes retirados dos arsenais foram convertidos em bastões (o que inviabiliza seu uso militar) e levados para a usina de pesquisas de Teerã, para os mencionados fins medicinais.

Mesmo uma solução intermediária ficaria difícil de ser aceita, caso o Ocidente não renunciasse às sanções, como contra- partida.

Se fosse fechado um acordo, em moldes semelhantes ao proposto pelo Ocidente, seria leonino, injusto. O Irã estaria dando muito e recebendo pouco.

Quando, posteriormente, se discutisse reduções mais significativas nas sanções, o Irã não teria com o que negociar.

A carta da paralisação do urânio enriquecido a 40% já fora jogada, deixando os iranianos sem nenhum trunfo nas mãos.

Apesar de todos essas considerações nada otimistas, o copo está ainda meio cheio.

Lady Aashton reúne-se com Saeed Jalil, o chefe dos negociadores iranianos, para marcarem a data de mais uma reunião.

Seja quando for, antes de junho não se espera que haja alguma solução em vista.

Nesse mês, realizam-se as eleições no Irã e ele não irá tomar nenhuma decisão antes de se conhecer o novo presidente.

Não que ele vá alterar basicamente a posição iraniana na questão do enriquecimento do urânio.

Todos os 20 pré- candidatos já se manifestaram firmemente a seu favor.

Todos condenaram as sanções e a intransigência dos EUA e aliados.

Quem poderá, eventualmente, mudar serão as potências ocidentais.

Isso se o vencedor for o candidato da oposição reformista ou do presidente Ahmadinejad, Eisnander Marshaei.

A oposição tem uma linha marcadamente liberal, pró estabelecimento de boas relações com o Ocidente.

Apesar de sua ligação com Ahmadinejad, Marshaei é um político de ideias avançadas para seu país, favorável à separação entre estado e religião.

Contrário ao papel secundário da mulher na sociedade iraniana, ele tem uma visão moderna do islamismo, quase herética para os aiatolás.

Teme-se que o supremo líder Kamenei vete sua candidatura pois já forçou Ahmadinejad a afastá-lo do cargo de vice-presidente.

A eleição de um reformista, possivelmente o ex- presidente Khatami, ou de Meshael criará um problema para os EUA.

Num mundo em que Israel, Índia e Paquistão podem produzir suas armas nucleares tranquilamente, a simples suspeita de que o Irã pretenda imitá-lolos já basta para atrair as fúrias ocidentais.

O motivo alegado é a barbárie iraniana, sintetizada na ameaça de Ahmadinejad de riscar Israel do mapa.

Sem Ahmadiejad na presidência, esta ameaça perde força, especialmente sendo o novo presidente  um reformista ou Meshael, ambos indivíduos civilizados, moderados, sem os rompantes do seu sucessor.

Em suma: alguém em quem, ao contrário de Ahmadinejad, se pode confiar.

Aí, cadê motivos para manter as sanções?

Claro, Telaviv poderá argumentar que Kamenei, como supremo líder, continua mandando. E ele é um perigoso fanático, no nível do falecido comunismo russo.

Ahmadinejad teria ido, mas o fanatismo e a loucura continuaria dando as cartas em Teerã.

Não é bem assim.

Se Kamenei  permitir as candidaturas de um reformista e de Meshael já será um sinal de que ele aceita conviver com mudanças.

Nessa saia justa que o regime vive, com o país massacrado pelas sanções, até os aiatolás podem achar uma boa buscar uma solução do problema..

Dá para prever que, ganhando um dos políticos inconvenientes para o establishment, o Irã será outro.

Mais confiável.

Claro que Israel jamais reconhecerá algo assim e continuará exigindo bombardeios das instalações nucleares de Teerã.

E os EUA, numa situação assim, o que farão?

Não vale dar uma de Nostradamus pois é muito difícil prever.

Pensando assim, acredito que Netanyahu vai redobrar suas pressões para que os EUA topem fechar a janela agora.

E atacar o Irã junto com ele. Antes de junho, quando as eleições do Irã podem tornar possível, o que hoje parece impossível.

A paz.

 

 

 

 

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