Desconfiança de Benny Gantz paralisa as anexações na Palestina.

Netanyahu anunciou que a anexação de 1/3 da Palestina ocupada será em 1 de julho, com apoio do partido Azul e Branco, que com seu partido, o Likud, forma a coalizão de governo.

Acho difícil.

A maioria do establishment israelense a deseja.

Mas, a ideia não é consenso entre analistas políticos e o exército do país.

Toda a Europa e os países árabes, mesmo alguns hoje próximos a Israel, rejeitam a anexação como ilegal e inaceitável.

Os EUA de Donald Trump hesitam.

E, por fim, o próprio Azul e Branco adota uma postura dúbia, diz que aceita a anexação, mas não do jeito com que Netanyahu pretende efetivá-la. Ou seja, unilateralmente.

Yoran Cohen, ex-chefe da agência de inteligência interna Shin Bet, considera a medida “um grande erro”.

“Por que vamos fazer isso?”  perguntou em entrevista à rádio 103FM.

Uma voz muito respeitada no país, o coronel da reserva Gilead Sher, que foi chefe do staff do ex- premier Ehud Barak e negociador-chefe das conversações de paz com os palestinos, informa que é típico dos chefes dos setores de segurança “referir-se à anexação como um desastre.”

Para Sher, esse passo não se baseia em razões nacionais ou de ordem internacional, mas em interesses políticos do governo de plantão.

Sher, que é pesquisador sênior do Instituto Nacional de Estudos de Segurança e do Instituo Baker, de Houston, EUA, declarou ao Middle East Eye: “Qualquer anexação unilateral – não importa a porcentagem anexada- é estrategicamente errada para Israel. Politicamente errada, diplomaticamente errada, economicamente errada. E certamente errada para a segurança de Israel.”

Até dirigentes partidários de extrema-direita são contra.

Ayelet Shaked, a bela ex-ministra da Educação de anterior governo de Bibi, diz que “Israel deve ter soberania somente sobre a área C (atualmente, administrada e policiada pelo governo de Jerusalém), onde vivem 450 mil judeus israelenses. Os 100 mil habitantes árabes devem contar com completa cidadania. Israel pode absorvê-los. E, definitivamente não impor soberania sobre as áreas A e B (administradas pela Autoridade Palestina, sob vigilância do exército israelense).”

Justo Ayeled que, em 2014, chamou as crianças palestinas de” pequenas cobras”, cujas mães deveriam ser mortas antes de dar a luz a elas (Mondoweiss, 29-05-2020).”

Embora a maior parte da população aprove a anexação, parece que muitos setores a vêm como algo prejudicial a Israel, alvo certo de enfáticas condenações internacionais, e causa de acirramento desnecessário de ações bélicas de movimentos islâmicos.

Pesquisa realizada em maio mostrava que o apoio à decisão de Netanyahu não era unânime pois contava com apenas 52% das pessoas, pouco mais do que a metade dos respondentes.

No plano externo, a situação é muito pior.

Praticamente toda a Europa, inclusive o Reino Unido, a França, a Alemanha e a Itália condenaram a anexação por violar direitos dos palestinos, reiteradas recomendações da ONU e as normas do Direito Internacional.

Em recente visita oficial a Israel, o ministro do Exterior da Alemanha, Heiko Maas, reafirmou a oposição do seu governo à anexação.

Embora social-democrata, Maas é grande amigo de Israel, seja qual for seu governo, mesmo o do direitista Netanyahu, que, aliás, não sai do trono há 14 anos.

Maas admitiu que vários países europeus devem aplicar sanções em Israel, o que seria uma experiência desagradável para o regime sionista, acostumado a ter suas violações dos direitos humanos criticadas severamente pela comunidade internacional, mas jamais atingidas por punições.

Mais significativa foi a posição do premier inglês, Boris Johnson, aliado de Trump.

Falando na Câmara dos Comuns, ele afirmou: “Acredito que o que está sendo proposto por Israel representaria uma brecha na lei internacional. Nós objetamos fortemente. Acreditamos profundamente na solução dos 2-Estados e continuaremos a defendê-la (Ynet, 16-06-2020).”

Outra má notícia para as intenções de Netanyahu: o respeitado embaixador da União dos Emirados Árabes em Washington, al Otaliba, escreveu no jornal israelense Yedioth Ahronoth, numa rara comunicação com o público judeu, que a anexação seria uma “tomada ilegal das terras que os palestinos desejam para seu Estado. A anexação…impediria todas aspirações israelenses para melhorar os laços de segurança, economia e cultura com o mundo árabe e a UEA.”

Isso poderia ser um golpe na aproximação de Israel com os países do Golfo Pérsico, com quem partilha intensas divergências com o Irã.

Durante os últimos anos, apesar de não terem assinado um acordo de paz com Jerusalém, as monarquias desta região tem intensificado negociações e acordos secretos com Israel.

Possivelmente, a anexação de grande parte das áreas palestinas provocaria furor de multidões dos países árabes, para quem defender os interesses de um povo muçulmano ultrajado é obrigação de todo o governo desse credo.

Mesmo as ditaduras do Oriente Médio receiam explosões populares de grande vulto.

De uma delas, a Jordânia, espera-se as reações mais fortes.

A Jordânia é uma das duas únicas nações árabes da região que assinaram um acordo de paz com Israel (a outra é o Egito).

Sua posição é estratégica, pois faz fronteira com Israel. O comércio entre as duas nações é intenso, coroado por acordos econômicos.

A Jordânia está ligada política e emocionalmente aos palestinos, já que grande número deles habita o reino hachemita, também responsável pela administração da principal mesquita árabe de Jerusalém.

O rei Abdula, da Jordânia, foi o primeiro chefe de governo árabe  a condenar, e duramente, a anexação,  deixando claro que tomaria atitudes agressivas, como congelar o acordo de paz e cancelar um acordo de bilhões de dólares que supre a Jordânia com gás israelense.

 Fez mais: negou-se a atender telefonema de Netanyahu que pretendia marcar uma reunião para discutirem a questão (Times of Israel,15-06-2020).

Estas objeções, que vem de todos os lados, preocupam muito o premiê israelense.

O que o deixa mesmo com a pulga atrás da orelha é a falta da desejada e necessária aprovação dos EUA.

O departamento de estado americano já disse que concorda com a anexação dos territórios palestinos.

Mas, Trump ainda não deu sinal verde, embora estejamos há menos de duas semanas do dia fatal da anexação.

Altos funcionários da Casa Branca já deixaram claro que The Donald só atenderá aos rogos de Netanyahu se o partido Azul e Branco, o outro membro da Coalisão de governo, aceitar expressamente os termos da anexação.

Ou seja, o presidente americano quer que essa medida represente a posição das duas partes integrantes do governo de Jerusalém.

O que, por enquanto, não aconteceu.

Benny Gantz, ministro da Defesa, e Gabi Ashknazi, ministro das Relações Exteriores, parecem hesitar. Negaceiam.

Além de exigirem conhecer todos os detalhes do plano de anexação que Bibi está forjando, deixam transparecer que não pode ser unilateral, mas em coordenação com a comunidade internacional e os países da região, especialmente as monarquias do Golfo Pérsico (Haaretz, 12-06-2020).

Uau! Estarão de brincadeira?

Vá lendo.

A Europa já repeliu a anexação, pode virar a mesa quando sacar que Netanyahu pretende mesmo bloquear a criação de um Estado palestino independente, como prometeu aos assentados. Talvez a reação europeia será pior se Bibi ainda negar cidadania aos árabe das regiões a serem anexadas.

Isso seria apartheid indiscutível, coisa tão grave que até mesmo a amigável Inglaterra tenderia a sancionar o regime sionista.

Acho quem nenhum país árabe, mesmo os reinados do Golfo, entraria nesta conspiração anti-palestina, sob pena de levar à loucura multidões de súditos hoje tranquilos.

Por outro lado, duvido que Gantz e Ashknazi irão deixar Netanyahu numa saia mais do que extremamente justa.

Possivelmente, receiam perdas de boa parte do seu público centrista contrário à anexação que, em recente pesquisa, somou 31% do total das pessoas ouvidas sobre esta questão.

Continuarão insistindo firmemente em conhecer detalhadamente o mapa das anexações de Netanyahu.

Provavelmente Bibi terá de lhes fazer concessões, como anexar aos poucos, admitir os habitantes palestinos como, pelo menos, cidadãos de segunda classe, com direitos limitados à representação política e ao voto.

E acabarão dando sua aprovação, removendo assim entraves para que Trump dê seu nihil obstat à extensão da soberania israelense pela Palestina à fora.

Por sua vez, convém ao morador da Casa Branca esquecer que seu plano falava em anexação acertada entre Israel e líderes palestinos.

Afinal, já se sabe que eles não vão aceitar nem a mediação americana, nem o apresamento israelense.

Há quem diga que The Donald tentará forçar Bibi a abrandar os duros termos da anexação. Talvez reforçando aquelas que o Branco e Azul deve pedir.

Afinal, depois do seu ridículo papel na crise da pandemia e na repressão às multidões anti-racistas, sua imagem ficou, digamos, danificada, e ele precisa evitar que se torne ainda mais suja, já que as eleições estão chegando.

E o eleitorado americano não vai gostar muito de sua posição pró-anexação, pois mostrou-se, em maioria, contrário, por um placar de 37% versus 34% (WashingtonReport on Middle East Affairs, junho/julho de 2020).

Como todo esse processo toma tempo, provavelmente o premier israelense terá de adiar seu sonhado evento.

Mas, que não demore demais, adverte Ron Dermer, ex-embaixador de Israel em Washington, e ardente defensor do aumento de Israel às custas de territórios palestinos.

Afinal, o democrata Joe Biden poderá vencer e vai que ele resolva dar um “basta” em la vie en rose israelense sob a proteção sem limites do governo de Washington.

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