A transparência vai a julgamento.

Na sua campanha eleitoral, Barack Obama prometeu que faria a administração mais transparente da história.

Poucos dias após sua posse como Presidente dos EUA, ele reafirmou seu compromisso.

O tempo provou que não era bem assim. Obama já mandou processar 6 pessoas pelo Espionage Act, por terem revelado informações que o governo queria manter secretas. Antes dele, houve apenas 3 processos semelhantes em toda a história dos EUA.

O mais rumoroso, talvez, é o processo contra o soldado Bradley Manning.

Ele forneceu ao Wiki Leaks uma série de memorandos e vídeos de autoridades civis e militares americanas, entre os quais o célebre “Assassinato Colateral”, que mostrava soldados americanos num helicóptero alvejando civis iraquianos a tiros de metralhadora, dos quais 12 morreram, sem qualquer indício de que fossem insurgentes.

O Pentágono reagiu indignado. Não contra os soldados assassinos, mas sim contra o homem que denunciara o crime., o qual,  após rigorosa investigação, descobriu-se ser o soldado Bradley Manning.

Enquanto isso, o Wikki Leaks publicava 92 mil documentos, escritos por pessoal de campo e da inteligência militar, entre janeiro de 2004 e dezembro de 2009, sob o título de “Diários da Guerra Afegã”. Documentos considerados secretos, proibidos de serem dados a conhecer por “razões de segurança nacional”. Na verdade, o motivo era bem outro: as autoridades americanas queriam esconder fatos graves que mostravam como a guerra estava sendo mal conduzida e o povo iludido com mentiras.

Bradley Manning, o responsável pelo vazamento dessas informações, foi preso em maio de 2010 numa base militar no Kuwait. Posteriormente, foi transferido para uma prisão militar, de segurança máxima, em Qantico, e por fim para outra base, esta de segurança média, em Fort Leavenworth, Kansas.

As condições de sua prisão foram vergonhosas, provocando protestos da opinião pública.

Chamado a intervir, Obama respondeu que o exército havia assegurado que Manning estava sendo bem tratado. E Obama, lógico, foi nessa.

Mas não a ONU. Juan Mendez, relator especial sobre torturas, acusou formalmente o governo dos EUA de “tratamento cruel, desumano e degradante’’ de Bradley Manning, especialmente “o excessivo e prolongado isolamento a que ele foi submetido durante os 8 meses que passou em Qantico”.

Manning foi mantido 11 meses em solitária, 23 horas por dia, em condições que o relator da ONU considerou que constituíam tortura.

Obama nem se tocou.

Bradley está sendo processado, sob 22 acusações pelo  Espionage Act, incluindo ajuda ao inimigo, traição e roubo de propriedade pública. O julgamento por uma corte marcial está marcado para agosto. Sendo condenado, Bradley poderá passar a vida inteira na prisão.

O interessante é que, enquanto a promotoria ainda estava estudando o caso, o Presidente Obama já se antgecipou, declarando que o soldado era culpado.

Como comandante em chefe das Forças Armadas, cujo tribunal decidirá o destino de Bradley Manning, Obama pronunciou o veredito antes do julgamento, procedimento adotado normalmente por Hitler e Stalin. Mas jamais num país realmente democrático.

Além de perturbar o processo, Obama cometeu uma falta grave, pois suas declarações forçosamente influenciarão as decisões dos juízes militares, que, de acordo com a Constituição, são seus subordinados.

Longe de ser o governo mais transparente da história que prometia, Obama está sendo o governo que procura com mais empenho impedir que erros, mentiras e abusos das autoridades dos vários setores cheguem aos ouvidos e olhos do povo.

Para isso, além de desejar punir Bradley Manning por supostos crimes que lhe valeriam a prisão perpétua, ele está processando mais 5 jornalistas por publicarem notícias carimbadas como classificadas, ou seja, proibidas de serem tornadas públicas.

Pretende que o jornalista James Risen, do New York Times, revele quem lhe informou sobre uma fracassada ação de espionagem da CIA para sabotar o programa nuclear iraniano.  Caso a Suprema Corte, nos termos do Espionage Act, atenda a seu pedido, acabará a tradicional proteção legal que é dada aos jornalistas para se recusarem a revelar suas fontes.

Daniel Ellsberg que , em 1971, revelou documentos mostrando como os presidentes Johnson e Nixon enganavam o povo com falsas notícias sobre a guerra do Vietnam, declarou: “Informações não-autorizadas são o sangue de uma democracia. Você não pode ter uma democracia verdadeira onde o público só recebe informações autorizadas pelo governo.”

Provavelmente um dos 6 processos movidos pelo governo  contra a transparência chegará este ano  à Suprema Corte.

Caso ela dê ganho de causa a Obama, ele poderá invocar o Espionage Act contra todo aquele que tornar público alguma ação que o governo deseje manter secreta.

Será o fim da liberdade de imprensa e da liberdade de se informar.

O presidente que, por recente lei, pode prender indefinidamente e sem julgamento, quem julgar uma ameaça à segurança nacional, pelo mesmo motivo poderia prender quem divulgasse notícias não autorizadas.

Vale terminar o artigo com uma citação de Benjamin Franklin, um dos chamados “Fundadores da Pátria”: ”Aqueles que renunciam à liberdade essencial para comprar um pouco de segurança temporária, não merecem nem liberdade, nem segurança.”

Luiz Eça

14/07/2012

www.olharomundo.com.br

 

2 pensou em “A transparência vai a julgamento.

  1. Belo artigo, dom Luiz – ao mesmo tempo, se os democratas estão assim que dirá os republicanos – en mexicano, es como salir de la sartén para caer al fuego…

    • Acho que nesta campanha os republicanos caíram tanto para a extrema direita que é capaz que o Obama seja empurrado para posições mais corajosas.Por enquanto, ele segue descumprindo as melhores promessas de sua campanha anterior.

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