O decreto dos super poderes do Presidente Morsi, levou mais de 100 mil manifestantes à Praça Tahir, exigindo seu cancelamento.
De nada adiantou a Morsi explicar que os assumira para evitar que a Justiça dissolvesse a Constituinte, como já fizera com a anterior, e o Conselho Shura (equivalente a Senado), como já fizera com a Câmara.
E que, uma vez a nova Constituição aprovada, esses poderes desapareceriam, substituídos pelos normais num regime democrático.
A oposição secularista – integrada por liberais, socialistas, nasseristas e coptas – continuou recusando-se ao diálogo, enquanto os superpoderes que, no dizer dela fazem do presidente um ditador, permanecessem.
Por sua vez, o judiciário recusou-se a admitir a perda do seu direito de revogar atos do governo e decidir sobre a continuidade da Constituinte e da Shura, coisa que deveria fazer em julgamento a realizar-se em dezembro.
Mortsi reagiu rápido.
Forçou seu partido, dominante na Constituinte, a apressar a conclusão do projeto constitucional.
E marcou para 15 de dezembro o referendo popular no qual o povo votaria pela aprovação ou não da nova Constituição.
Isso acontecendo, em pouco tempo, o Egito democrático entraria nos trilhos, as eleições legislativas seriam realizadas e o presidente passaria a ter seus poderes limitados constitucionalmente.
E de fato, o primeiro ministro, Hishan Qandi, esclareceu publicamente que, aprovada o projeto da nova constituição, todos os superpoderes seriam cancelados.
Julgava Morsi que assim pacificaria o país.
Mas não conseguiu.
Desde o início a Constituinte foi criticada asperamente pela oposição secularista.
Ela acusava a Irmandade Muçulmana e aliados salafitas , maioria no Congresso, de terem imposto um número excessivo de representantes no colegiado de 100 membros, que deveriam elaborar a nova Constituição.
O objetivo deles seria tornar o Egito uma república islâmica, no estilo do Irã.
No decorrer dos trabalhos constitucionais, os choques se sucederam e grande número de oposicionistas renunciaram.
Na discussão final, estavam presentes apenas 85 representantes, que aprovaram um projeto fortemente condenado pela oposição.
Que arrastou novas multidões à praça Tahir, protestando e exigindo até a renúncia de Morsi.
A Irmandade Muçulmana, por sua vez, realizou também uma gigantesca manifestação de massa, de apoio ao presidente.
E o Egito está claramente dividido.
Analisando as razões da oposição, vemos que, de fato, a Irmandade Muçulmana abusou de sua maioria, dando pouco espaço à Oposição na Constituinte.
Já o projeto da nova constituição não é nenhuma maravilha.
Mas também não “deixa de lado os direitos humanos” nem é “anti-democrático”, conforme as acusações.
Nela se criticam os privilégios aos militares.
De fato, o governo fez concessões para convencer a Junta Militar a retirar-se da direção do país. Mas não foram tão graves assim.
Os civis continuam podendo ser julgados por tribunais militares ,porém, somente quando cometerem crimes contra as Forças Armadas.
Os orçamentos militares continuam secretos só que terão de ser aprovados por um Conselho integrado pela presidência, alguns ministros, os presidentes das duas câmera legislativas e os chefes das três armas.
Os secularistas aceitam que os princípios da sharia (princípios do islamismo) sejam a principal fonte de Direito do Egito, mas não concordam que um artigo inclua neles leis e jurisprudências dos grandes estudiosos sunitas.
Acham isso vago, podendo permitir que, posteriormente, se aprovasse leis retrógradas, vigentes em regimes fundamentalistas.
Um artigo que determina a proteção estatal da “natureza verdadeira da família egípcia…e promova sua moral e valores” e outro que proíbe “insultos às pessoas”para garantir a dignidade das pessoas“ são vistos como porta aberta para a censura dos meios de comunicação.
A oposição ainda contesta um artigo, dispondo que o estado deve apoiar as ciências, as artes e a literatura a serviço da sociedade. Teme que obras artísticas não voltadas para “servir a sociedade” sejam restringidas ou censuradas.
Por fim, embora a tortura e a prisão sem julgamento sejam proibidas, reclama-se a falta de uma explícita defesa dos direitos humanos.
São estes alguns dos principais aspectos condenados do projeto constitucional.
Como se vê, não são tão graves assim. De qualquer maneira, sempre há possibilidade de emendas posteriores corrigirem o que está errado, ou enunciado ambiguamente.
Nada que justifique uma segunda revolução, como alguns líderes políticos egípcios vem propondo.
A verdade, porém, é que um país não pode passar muito tempo desorganizado, sem leis claras e definidas, que cubram todo o espectro de necessidades institucionais.
Repetidas manifestações de massa, constantes choques entre grupos e com a polícia, tudo isso configura uma situação revolucionária que não convém prolongar-se por muito tempo.
O Egito já vive assim há 2 anos, com consequências muito graves na sua economia.
O regime de Mubarak foi derrubado, as forças militares foram afastadas do comando da nação, é hora do Egito começar a levar vida normal.
Tem um presidente eleito e, em breve, com uma nova constituição, terá eleições para o Legislativo.
Só falta que a oposição caia na real e procure por racionalidade nas suas ações.