Bahrein: chuvas e trovoadas na primavera árabe

A Primavera Árabe parecia que iria dar frutos no Bahrein. Depois de 5 meses de ataques das forças do governo contra manifestantes pacíficos, um acordo pintou como possível.

As partes reuniram-se em 2 de julho para negociar a paz. Sem dúvida, graças aos esforços da Casa Branca, visivelmente incomodada com a situação, na qual, enquanto apoiava o governo local, atacava militarmente o da Líbia pelo mesmo motivo: disparar contra civis desarmados.  
Mas, veja bem, somente depois de controlar a revolta popular é que a monarquia absolutista que rege o Bahrein consentiu em dialogar com os rebeldes.
A Primavera Árabe começara em fevereiro, quando uma multidão de xiitas, que representam 70% da população de 1 milhão de habitantes, saiu às ruas protestando contra a discriminação que sofriam por parte do governo e exigindo reformas democráticas que limitassem o poder do rei.
A exemplo do que aconteceu na Tunísia e no Egito, as manifestações de protestos se sucediam, sem parar. E a exemplo do que aconteceu naqueles países, a polícia e o exército locais intervieram com violência. Mas o povo não cedeu, continuou na rua, agora exigindo a queda de ministros e mesmo a mudança do regime para uma monarquia constitucional.
Aí era demais para o rei que chamou em seu auxílio sua poderosa vizinha e aliada, Arábia Saudita. Tão absolutista quanto o Bahrein, o governo saudita, temendo pelo contágio dessas “subversivas” idéia democráticas, apressou-se em enviar tropas e até tanques de guerra para enfrentar a multidão desarmada.
E o Bahrein tornou-se um estado policial. Reforçado pelo aparato saudita, o exército local não chegou a esmagar totalmente a revolta, mas matou muita gente e recuperou o controle das ruas.
Enquanto isso, os EUA, ao contrário do que fizeram na Líbia, limitavam-se a apelar ao bom senso, pedindo moderação aos litigantes. Os rebeldes não atenderam. Muito menos o governo que lançou mão de um recurso inédito para conter os manifestantes: ocupou militarmente os hospitais e impediu que socorressem os indivíduos vítimas da ação de suas tropas. Foi mais além: prendeu, processou e mesmo torturou os médicos que ousaram tratar os rebeldes feridos (conforme denúncia da Anistia Internacional). Por sua vez, a polícia realizou prisões em massa de líderes xiitas. Para silenciar aqueles que poderiam denunciar as violências que estavam sendo cometidas, tratou de prender também dirigentes e ativistas de movimentos de defesa dos direitos humanos. Leis de emergência davam às forças de segurança o direito de vasculhar casas sem mandado e dissolver organizações, inclusive partidos políticos, que considerassem um perigo para o estado.
Com a Primavera Árabe devidamente contida no país, o rei dispôs-se a atender aos EUA. Em junho, cancelou as leis de emergência e decretou um mês de diálogo com a oposição, para se discutir reformas constitucionais. Mas tomou suas precauções. Manteve nas prisões centenas dos manifestantes, entre os quais alguns dos principais líderes da comunidade xiita. E fez questão de escolher os 300 participantes do diálogo, sendo que apenas 6 deles eram membros do Al-Wefaq, principal partido da oposição xiita, que elegeu 60% dos parlamentares na última eleição. O resto da oposição era também sub-representado. E o príncipe Salman bin Hamad al-Khalifa, o único membro da família real, que demonstrou receptividade às reformas democráticas pretendidas, foi impedido de participar das discussões.
Como disse Joe Stork, diretor da divisão do Oriente Próximo do Human Rigth Watch : “Não é um diálogo, é uma convenção.” Com apenas 35 oposicionistas entre os 300 participantes, cedo constatou-se que o Dialogo Nacional não passava de um monólogo onde a voz do governo era a única que pesava.
 Não demorou muito para que o principal partido oposicionista se retirasse.  Mesmo assim, as conversações prosseguiram. Comentando o resultado delas, Sayed Al-Mousawi, líder do partido Al-Wefaq, disse :”O governo achou que os resultados foram ótimos. Nós achamos que não foram nada. Não haverá governo eleito com poderes plenos, nem reformas do sistema de votos – tudo foi feito para beneficiar um só lado.” Acrescente-se que, embora deva acontecer eleições para a Câmara dos Deputados, os membros do Senado deverão ser indicados pelo rei, o que lhe garantirá o controle do Legislativo.
 Para a grande mídia internacional, o Bahrein não é mais notícia.
 Aparentemente, as coisas por lá se tranqüilizaram. Há poucas manifestações de protesto, as passeatas que fecham o trânsito são raras.
 É a paz dos túmulos.
 O governo promoveu a despedida de 3.600 oposicionistas, torturou centenas, matou cerca de 40, prendeu mais de 1.400. Pouco, em termos absolutos, muito, em relativos, se considerarmos que existem no país apenas 525 mil cidadãos. Para a Human Rights Watch foi feita “uma repressão sistemática e abrangente para punir e intimidar os críticos do governo e por fim às raízes e ramos da revolta.”
 No entanto, os líderes da Primavera Árabe no Bahrein não desanimam. Desistiram dos EUA, em cujas declarações pela democracia e direitos humanos confiavam. Que foram praticamente desmentidas quando o Almirante Mullen, Chefe do Estado Maior combinado das Forças Armadas americanas, declarou que não se podia tratar o Bahrein como a Líbia, já que tinha sido um aliado “por décadas.” Por sinal, aliado gratificado com um acréscimo de 26 milhões de dólares anuais em sua ajuda militar.
 A monarquia saudita bem que poderá precisar.
“A situação é como uma mecha, alguma coisa poderá acendê-la a qualquer momento”, disse Ali Salman, Secretário-Geral do Partido Al Wefaq.”Se não conseguirmos trazer democracia para nosso país, então nosso país optará pela violência. Em um ano? Dois anos?”

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