Quem não quer a paz.

Em artigo publicado no caderno Ilustríssima, Caetano Veloso declara-se simpático à causa palestina nos conflitos com Israel.

O que João Pereira Coutinho, na edição de 10 de novembro da Folha, contesta: a culpa dos desentendimentos é dos palestinos, que sempre se recusaram a aceitar concessões territoriais israelenses em troca da paz.

A história mostra que intransigentes são os  israelenses.

Isso começou na Partição da Palestina, quando a ONU atribuiu 55% do território a Israel e apenas 44% aos árabes.

Inconformados com o fato dos árabes palestinos terem de entregar mais da metade do país, que habitavam há 14 séculos, a um povo que só começara a chegar há menos de 60 anos, os países árabes vizinhos atacaram Israel.

Mas foram derrotados.

Vencedor, Israel impôs uma nova participação: agora ficaria com 78% do território, cabendo aos árabes da Jordânia  20%, ou seja a Cisjordânia (para onde fugiram 700 mil palestinos), e Gaza ao controle egípcio.

Foi quando o conde Folke Bernadotte, mediador da ONU    entre árabes e judeus, chocado com essa “desafortunada” divisão, propôs uma alternativa, menos injusta para os palestinos.

Seria concedida uma área maior aos palestinos e em troca os árabes deveriam aceitar a paz.

A resposta do movimento terrorista judaico Lehy foi assassinar o conde Bernadotte.

Daí em diante, os conflitos se sucederam.

Em 1953, foi fundado o movimento revolucionário Fatah, sob liderança de  Yasser Arafat, com o objetivo de recuperar toda a Palestina pela via militar.

Em 1964, esse e outros grupos criaram a OLP.

Começaram a espocar ataques guerrilheiros contra posições  israelenses

Em 1967, época em que Nasser do Egito procurava criar uma aliança da países árabes contra Israel, aconteceu a chamada “Guerra dos 6 dias”.

Sem haver uma declaração de guerra, a força aérea israelense bombardeou de surpresa os aeródromos egípcios (bem no estilo Pearl Harbor), destruindo todos os aviões da força aérea rival, garantindo assim a vitória antes do jogo começar.

Nessa ocasião, o governo de Telaviv declarou que apenas se defendera de um ataque maciço que os egípcios e países liderados se preparavam para desfechar contra Israel.

Teria, pois, a justiça a seu lado.

Essa história foi tão bem vendida ao mundo que, apesar dos desmentidos árabes, passou por verdade indiscutível.

Só recentemente, a revelação de documentos desclassificados de altas autoridades dos EUA, França, Reino Unido e União Soviética demonstrou que não foi bem assim.

No seu livro “The Six-Day War and Israeli Self-Defense: Questioning the Legal Basis for Preventive War”, publicado pela Editora da Universidade Cambridge, John Quigley, professor de direito da Universidade Ohio, dá uma nova versão dos fatos, inquestionável pela documentação apresentada.

Ele publica minutas de reuniões do gabinete ministerial inglês; de uma publicação do governo francês  e documentos americanos do relatório ‘Foreign Relations of the United States, onde se lê que Israel sabia que o Egito, a Síria e a Jordânia não pretendiam, nem queriam atacar o país; já que ainda não tinham condições de derrotar seus inimigos.

Mas Israel aproveitou as mobilizações militares e ameaças dos árabes para justificar uma guerra preventiva, com o objetivo de dizimar as forças do Egito; e conquistar Jerusalém Oriental e a Cisjordânia, completando seu domínio sobre a Israel dos tempos bíblicos, sonho dos líderes sionistas…

Em 1973, derrotados numa terceira guerra, a maioria dos países árabes assinaram acordos de paz com Israel, sendo que Egito e Jordânia até trocaram embaixadores, reconhecendo o Estado israelense.

Mas os palestinos ficaram de fora.

Não lhes foi oferecida qualquer compensação territorial nas regiões que sempre foram suas.

Movimentos rebeldes não cessaram de lutar contra Israel.

O objetivo da maioria deles era destruir o governo sionista e implantar uma república bi-racial, na Palestina Entre outras ações, lançaram atentados que vitimaram civis israelenses inocentes.

Como reunia a maioria desses movimentos rebeldes, a OLP (Organização Pela Libertação da Palestina) acabou reconhecida pela ONU como representante do seu povo.

E , em 1988, Iasser Arafat, o presidente, anunciou que a OLP renunciava ao terrorismo, condenava sua prática e aceitava a existência de Israel, mas insistia na independência da Palestina na Cisjordânia, ocupada por Telaviv.

Com esta redução capital das reivindicações palestinas, parecia abrir-se um caminho para a solução da crise.

Uma possibilidade que ficou ainda maior em 1993, com o acordo de Oslo, no qual Israel e palestinos concordaram na solução dos “2 estados e 2 povos”.

A Cisjordânia foi dividida em três áreas, cabendo a administração e segurança a uma Autoridade Palestina. Sempre sob controle de Israel.

De lá para cá foram feitas várias tentativas para se chegar a um acordo entre as partes.

Ao contrário do que diz João Pereira Coutinho, todas elas fracassaram porque Israel não tinha o menor desejo de entregar a Cisjordânia conquistada em 1967.

Sempre que se esteve perto de um acordo, os israelenses fizeram algo para romper as negociações.

Quando o  Hamas, acusado de várias ações terroristas,    venceu as eleições de Gaza e assumiu o governo, propôs uma trégua de 10 anos.

“A resposta dos israelenses foi caçar os membros do Hamas por terra, mar e céu” (Amnon Kapeliuk, analista do Oriente Médio).

Gaza foi submetida a um bloqueio, que já dura 9 anos, num verdadeiro ato de terrorismo contra todo um povo. Em várias guerras, as forças armadas israelenses devastaram toda a região, destruindo sistemas de água, esgotos e energia elétrica , toda a sua estrutura econômica e dezenas de milhares de habitações.

Gaza tornou-se segundo o cardeal Renato Martino, então presidente da Comissão de Justiça e Paz do Vaticano “…cada vez mais um grande campo de concentração.”

.Depois da eleição de Mahmoud Abbas para presidente da Autoridade Palestina, diversas negociações foram tentadas, sob o patrocínio dos EUA.

Mesmo o Hamas, que antes prometia destruir Israel, caiu na real.

Em 2006, já abolira oficialmente o terrorismo (só voltou a lançar foguetes contra Israel durante as guerras  de Gaza). Em 2010, seu líder Ismail Hanyeh declarou numa conferência de imprensa em Gaza: “Nós aceitamos um Estado palestino nas fronteiras de 1967, com Jerusalém como capital”. Renunciou, portanto, ao território que hoje é Israel.

Além disso, outro dirigente do Hamas, ao anunciar sua união com o Fatah (base da OLP) declarou explicitamente que aceitava a solução dos dois estados, separados pelas fronteiras de 1967.

Permaneciam, é verdade, questões a serem discutidas: a posse de Jerusalém Oriental, a volta ou indenização dos 700 mil palestinos expulsos para os países vizinhos e o reconhecimento de Israel como país sionista.

Para se sentarem à mesa das negociações, os palestinos exigiam a libertação dos presos políticos. E, principalmente, o fim da expansão de assentamentos em terras da Cisjordânia e Jerusalém Oriental.

Certo.

Se Israel dizia-se disposto a entregar a Cisjordânia conquistada, porque insistia em construir  assentamentos na região?

No governo Netanyahu, Israel, como sempre, se negou a interromper os assentamentos, que, aliás, já contam com 500 mil habitantes.

E as negociações não passaram daí.

Mas o presidente Obama pressionou e Abbas cedeu: novas negociações de paz poderiam começar mesmo com novos assentamentos brotando.

Havia inclusive disposição dos palestinos de trocarem áreas ocupadas pelos principais blocos de assentamentos por regiões pouco habitadas de Israel.

Isso foi em 2014 e, como se sabe, mais uma vez as negociações não deram em nada.

De quem teria sido a culpa?

Veja a opinião de Barack Obama, presidenre dos EUA, o principal aliado de Israel no mundo.

Em entrevista à TV israelense, Obama declarou que as propostas de paz estabelecidas por Netanyahu incluiriam “tantas advertências, tantas condições que não é realista pensar que essas condições poderiam ser atendidas em qualquer momento num futuro próximo”.

E acrescentou:”No momento, a comunidade internacional não acredita que Israel é sério sobre a solução dos dois estados.”

Um eminente judeu, Albert Einstein, já havia se declarado muito preocupado com isso.

“Se formos incapazes de encontrar um caminho de cooperação honesta e acordos honestos com os árabes, então nós não aprendemos absolutamente nada durante 2 mil anos de sofrimentos e mereceremos tudo que acontecerá a nós.”

Caetano sabia o que estava falando.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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