Segunda Guerra Fria à Vista

A Rússia está longe de ser a potência que a União Soviética foi.

Mas ainda é um grande país, com imensas reservas de petróleo e gás, uma indústria de armamentos poderosa e, o que é mais importante, muitas bombas nucleares.
Para os desígnios imperiais de George Bush, o país de Tolstoi precisava ser contido para deter futuras e possíveis expansões.
Daí sua idéia de um sistema de defesa anti-míssil cercando as fronteiras russas, além de bases militares em algumas das antigas repúblicas soviéticas ao sul do país.
Unia-se o útil ao agradável, pois esse projeto envolveria a aplicação de bilhões de dólares em armamentos, para felicidade das empresas do setor.
Como não era conveniente brigar com os russos, Bush informou que o escudo anti-míssil destinava-se a proteger a Europa de futuros e possíveis ataques nucleares do Irã ou da Coréia do Norte.
Putin não aceitou esta desculpa. Protestou, alegando que essa defesa anti-míssil na verdade seria anti-Rússia. E surpreendeu Bush com uma proposta alternativa: criar um sistema unificado de defesa usando bases no interior da Rússia e do Afeganistão.
Bush não topou, é lógico, e as coisas ficaram por isso mesmo.
Com Obama, o projeto de Bush foi recuperado. Ele insistiu com os russos, jurou que seria também para o bem do país deles.
Ainda mais agora que Amano, da Agência Internacional de Energia Atômica, via provas de que o Irã estaria mesmo produzindo armas nucleares.
Só que, para os russos, o relatório de Amano não vale o papel onde foi escrito. Afinal, fora, em grande parte, baseado em informações de serviços secretos de países hostis ao Irã. Além disso, afirmava que o programa dos iranianos teria sido assessorado por um cientista nuclear russo, quando na verdade o tal cientista era especialista em nanodiamantes.
Fala-se que a Rússia iria propor na ONU uma moção de censura ao prestimoso Amano, inclusive por ele ter vazado para o Ocidente os principais pontos do seu relatório, antes da apresentação oficial.
Respondendo aos americanos, o Presidente Medvedev declarou que Putin estava certo ao considerar o escudo anti-míssil como uma agressão à Rússia. E mais: seria a preparação para um ataque ao Irã, país com quem os russos tem crescentes laços de amizade, fortalecidos por crescentes negócios,muito importantes para Moscou.
Medvedev não ficou nas palavras. Anunciou que caso os EUA insistam em continuar seus planos mandaria instalar uma formação de mísseis em Kaliningrado, próxima à fronteira oeste, apontados para os locais na Polônia e na República Checa onde estariam instaladas partes do escudo anti-míssil de Obama.
E, na semana passada, nova ameaça: fechar a estrada que passa pela Rússia por onde caminhões levam suprimentos ao exército da OTAN no Afeganistão.
Esta decisão, se concretizada, vem em péssima hora para os EUA. O Paquistão acabou de fechar a outra estrada que é usada para esse transporte. Foi uma retaliação ao ataque de aviões e helicópteros da OTAN, a maioria americanos, contra uma base do exército paquistanês, matando 28 soldados.
As forças americanas no Afeganistão ficam em situação difícil, sem ter como receber os suprimentos de que carecem. A essas alturas, Obama começa a pensar duas vezes se é conveniente continuar com os planos do escudo anti-míssil.
Mas há um outro front onde EUA e Rússia trombam nesta 2ª Guerra Fria que está se esboçando.
Não é segredo nenhum que Obama, apoiado por Sarkosy, Cameron e agora também pela Turquia e os estados do Golfo, pretende, mais dia menos dia, atacar a Síria.
Para ele, seria um avanço no cerco ao Irã, pois a Síria é o maior aliado do governo de Teerã. Além disso, derrubando Bachar e instalando um governo amigo, os americanos poderiam enfraquecer (talvez destruir) sucessivamente o Hisbolá, no Libano, e o Hamas, em Gaza. Matariam não dois, mas três coelhos de uma só vez: o Irã perderia forças políticas que o apóiam, Israel aplaudiria a derrota desses desafetos e Obama ganharia a gratidão (e os financiamentos de campanha) dos lobbies israelo- americanos
Novamente, as ações americanas esbarram nos interesses russos. A Síria é antiga aliada de Moscou, com quem mantém sólidas e lucrativas relações comerciais. É nesse país que se localiza a única base naval russa no Mediterrâneo, em Tartus.
Claro, Medvedev não poderia passar recibo. Ao lado da China, do Brasil e de outros países, manifestou sua oposição a sanções da ONU contra a Síria e, mais do que isso, a qualquer manifestação do Conselho de Segurança que abra brechas para nova intervenção militar da OTAN e dos EUA.
E a Rússia não ficou nisso. Anuncia-se que técnicos russos já estão trabalhando com os sírios para a instalação de um avançado sistema de mísseis S-300, capaz de impedir a implantação de uma “zona de exclusão aérea”, como foi feita na Líbia.
E, para conter ataques vindos do mar, a Rússia firmou um contrato com a Síria, no valor de 300 milhões de dólares, para fornecer 72 mísseis de cruzeiro que protegerão toda a região costeira do país.
Completando esse quadro, o representante da Rússia na OTAN (na qualidade de observador) anunciou que viajará à China e ao Irã para discutir a idéia de escudo global de mísseis.
Como se sabe, a China também se ressente de novas posturas ativas do governo Obama no Extremo Oriente, que é a área de influência de Pequim. Delineia-se ali uma disputa entre as duas grandes potências pela hegemonia na região.
China e Rússia, por estarem sendo prejudicadas por ações imperiais do governo americano, tendem a se aproximarem e formarem um bloco, unidos pelo inimigo comum.
Não é assim que acontecia no início da 1ª Guerra Fria?

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