Quem influencia quem?

Os militares egípcios derrubam o presidente  Morsi, democraticamente eleito, assumem o governo, prendem Morsi e os líderes da Irmandade Muçulmana, fecham os jornais e TVs da oposição, demitem o parlamento eleito e anulam a constituição.

E Obama apressa-se a reconhecer o novo governo, espera que logo tudo se normalize e pede por moderação e respeito aos direitos humanos.

O Egito recebe 1,5 bilhão de dólares de ajuda militar americana.Pelas leis dos EUA, eles não podem prestar ajuda a governos surgidos de golpes de estado.

Mas Obama faz de conta que isso não aconteceu no Egito.

Os chefes militares egípcios reprimem à bala manifestações da Irmandade Muçulmana, matando 51 civis. Alegam que apenas se defenderam dos tiros de “15 motociclistas armados”, embora testemunhas afirmem que os tiros partiram dos soldados e ninguém viu os misteriosos motociclistas (seriam Hell´s Angels árabes?).

Mesmo pressionado, Obama recusa-se a falar em golpe, limita-se a deplorar a matança, recomendar serenidade e respeito ao direito de manifestação.

Indiferentes a ele, os militares atacam uma nova manifestação, matando de 82 a 100 pessoas e ferindo mais de mil. Dizem que usaram só gás e balas de borracha para impedir conflitos entre oposicionistas e vizinhos, irritados com o barulho… Médicos e correspondentes estrangeiros comprovam marcas de balas nas vítimas.

Os EUA condenam o massacre , mas não o governo responsável por ele.

Por fim, Obama fala através do seu porta- voz: pela lei, os EUA não são obrigados a analisar se houve golpe ou não. Sendo assim, não há porque deixar de enviar os armamentos para o Egito.

Dizem que ele ficou muito vermelho quando apresentou esta curiosa análise a jornalistas, seu nariz cresceu desmesuradamente, estilo Pinochio.

Não dá para classificar essa interpretação nem como cerebrina; é ridícula demais. Comprova, mais uma vez, o desrespeito do governo Obama pelas leis, que ele só acata, quando não contrariam suas políticas.

Ou quando prejudicam seus adversários.

Como nos direitos humanos, cuja violação seu governo denuncia indignado quando feita por países ditos hostis (que não obedecem aos EUA) como o Irã, a Síria e a Venezuela.

Quando os réus são países amigos, tipo Israel ou Arábia Saudita, aí quaisquer barbaridades são ignoradas. Ou justificadas na ONU, como na recente guerra de Gaza.

No caso dos EUA, se aplica a excepcionalidade americana.

Quer dizer: mesmo quando contrários às leis, atos do governo de Washington devem ser aceitos, pois suas intenções são sempre puras e certas.

No caso do Egito, a Casa Branca torce a lei como um pano de lavar chão para poder mandar o 1,5 bilhão para os militares egípcios e assim garantir sua influência sobre eles.

O que é importante em primeiro lugar, para fazer com que respeitem os direitos humanos e entreguem o poder aos civis, sem continuarem como guardiães do governo.

Em segundo lugar, para preservar a ligação entre os militares dos dois países e assim não deixar que o Egito saia da órbita do bom Tio Sam.

Em terceiro lugar, para atender a Israel, o sobrinho bem amado, que precisa dos militares egípcios para limpar o deserto do Sinai de jihadistas, vizinhos incômodos e perigosos.

O problema é que, cada vez mais o novo regime egípcio se configura sob hegemonia militar, ditatorial e violador dos direitos humanos.

Somente nos últimos dias, Mansur, o presidente interino escolhido pelos militares, concedeu ao exército poderes de polícia completos.E ao ministro do Interior, Ibrahim, poder para colocar a nação em estado de emergência.

Last but no least, refundou a polícia secreta, a mais  nefanda instituição da era Mubarak. Um dos principais alvos da revolução egípcia que a fechou logo no primeiro ano pós-ditadura.

Essa famigerada polícia secreta, ”…cometeu as mais atrozes violações dos direitos humanos”, conta Aida Seif al-Dawla – diretora executiva de uma ONG dedicada à reabilitação de pessoas vítimas de torturas.

Enquanto isso, a repressão prossegue a todo vapor.

Mais de 300 civis assassinatos pelas forças de segurança, muitOs delEs perfeitamente documentadas.

Fica muito difícil para Obama continuar se negando a chamar de golpe o que está acontecendo no Egito.

E a manutenção do pacote de bondades de 1,5 bilhão em armamentos parece não estar influenciando os militares para se comportarem bem.

Apesar das advertências, conselhos e recomendações da Casa Branca, eles continuam matando em massa, prendendo opositores, negando liberdade à imprensa e revivendo instituições e decretos que tornaram a ditadura Mubarak detestável.

Na verdade, quem está sendo influenciado são os EUA.

Ansioso para conservar o favor dos militares do Egito, Obama vem adulterando uma lei americana. Lança mão de uma interpretação ridícula, digna de um comediante, não de um estadista.

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