O repórter investigativo Seymour Hersh foi quem revelou o massacre de My Lai, na guerra do Vietnam, e as torturas em Abu Ghraib, na guerra do Iraque, todos por obra e graça do exército americano. Entre outras reportagens célebres,
Suas matérias são sempre muito respeitadas pois suas fontes são membros civis e militares senior dos órgãos de segurança americanos e oficiais atuantes nas intervenções externas dos EUA.
O trabalho de Hersh em incomodado bastante o establishment corporativo-militar americano e mesmo a Casa Branca.
Era fatal, Hersh acabou entrando na lista negra da timorata grande mídia dos EUA.
Ele acabou tendo de recorrer à imprensa britânica para publicar suas matérias, mais exatamente à London Books Review.
No entanto, nem esta revista teve coragem de publicar a mais recente reportagem de Hersh, pois iria deixar o governo americano perigosamente enfurecido.
Felizmente, o prestigioso jornal alemão Welt não fugiu da raia.
O texto de Seymour Hersh precisava se tornar público pois iria desmascarar uma vergonhosa armação do presidente Trump e assessores.
Depois de sair no jornal e no site do Welt, a reportagem proibida foi veiculada e comentado na imprensa alternativa dos EUA, Reino Unido e outros países.
Menos no Brasil.
Para que você não ficar por fora de um fato da maior importância, leia o texto abaixo onde apresento os principais pontos do texto explosivo de Seymour Hersh.
No princípio de abril deste a ano as redações dos jornais de todo o mundo receberam uma avalanche de fotos e vídeos mostrando pessoas mortas e no processo de morrer.
Os textos que as acompanhavam diziam que foram vítimas de um bombardeio do terrível gás sarin, lançado por aviões sírios contra o povo da cidade de Kham Sheikhoum, ora em mãos de rebeldes.
Embora, não tivesse sido provado a origem dessa barbaridade, os jornais e governos dos cinco continentes concluíram que o autor só poderia ser o governo Assad. Sob o impacto de uma divulgação maciçamente espalhada por jornais, Rádio, Revistas e TV- a população convenceu-se das culpas de Assad.
Rússia e Síria negaram, pedindo a formação de um comitê imparcial que fosse a Kham Sheihoum analisar a questão. Antes disso, porém, The Donald, unilateralmente e sem autorização da ONU, lançou 54 mísseis Tomahawk contra uma base aérea síria, destruindo aviões e matando militares e civis.
Enquanto Trump, vaidoso como um pavão, recebia as honras e elogios de estadistas europeus e do público americano, houve quem tivesse ficado desagradavelmente surpreso: membros civis e militares e oficiais lotados na região.
Aqui cabe algumas explicações.
A cidade de Khar Sheikoum é dominada por rebeldes jhiadistas- os grupos Nussra e Ahar al-Sham, ambos terroristas e considerados como alvos de ataques pelos governos em luta na Síria.
Existe na cidade, um edifício de dois andares, onde os grupos terroristas estocavam gás propano e fertilizantes, no térreo, além de alimentos, água e gasolina, distribuídos grátis para os jihaditas controlarem a população local. No porão guardava-se munições, armamentos e foguetes.
O andar superior era reservado para reuniões do comando central na área.
A inteligência russa tinha detectado tudo isso e mantinha idas e vindas de milicianos sob observação através de drones.
Descobriu que estava para ser realizada uma reunião no local com a presença de importantes líderes das organizações terroristas.
Um bombardeio poderia matar ou ferir muitos desses inimigos. Russo e sírios decidiram pelo ataque a ser feito por um avião sírio, pilotado por seu melhor piloto.
Trataram de informar imediatamente a inteligência americana dos motivos e resultados buscados por essa operação aérea, como tanto russo, quanto americanos habitualmente fazem em casos semelhantes.
Essa comunicação foi recebida e confirmada em Doha, onde se coordenam os voos dos aviões de guerra dos EUA e aliados e da Rússia e Síria para que não se encontrem. O que poderia causar combates, que eventualmente levariam a uma conflagração ampla, totalmente indesejável.
Os russos cuidaram de fazer essa comunicação com grande antecedência, pensando em evitar a possível morte de um agente da CIA que poderia estar infiltrado entre jiihadistas.
Portanto, os EUA estavam informados de que um avião sírio bombardearia um edifício em Kha Sheikhoun, usando bombas normais, com o objetivo de eliminar chefes terroristas de alta periculosidade.
Tudo isso foi informado a Hersh por um conselheiro-senior de inteligência os EUA, que havia atuado em posições de destaque no Departamento de Defesa e na CIA.
Bem, o ataque realizou-se e, para estupefação de todos os oficiais e agentes da inteligência americana por dentro de sua realização, foi mostrado à opinião pública internacional como um ataque a gás promovido pelo governo Assad contra civis inocentes.
A princípio as declarações das autoridades americanas de diversos setores pareciam desconectadas entre si, mas com os incisivos pronunciamentos de Trump acabaram se unificando na condenação de um ataque a gás que jamais aconteceu.
Os oficiais que haviam acompanhado tudo, desde a informação pelos russos sobre o ataque que os sírios fariam contra a reunião de terroristas, não vieram publicamente desmentir o presidente provavelmente para não prejudicar a imagem da política externa dos EUA.
Mas vários deles manifestaram sua indignação ao repórter Seymour Hersh com expressivas declarações como: “Não foi um ataque químico. Isto é um conto de fadas”. “Nada disso faz sentido. Nós sabemos que não foi um ataque químico. Os russos estão furiosos… Clamam que nós tínhamos em mãos a inteligência real. Conhecíamos a verdade. ”
Os desdobramentos são bem conhecido. Trump lançou um ataque de mísseis contra uma base aérea síria, aplaudido de pé por quase todos os países do mundo.
Um caso claro de que às vezes, o crime compensa.
Mas, o fato é que o bombardeio da sala de reuniões do prédio alvo atingiu muito mais do que os jihadistas reunidos (matou quatro líderes e muitos seguranças). Hospitais das regiões próximas registraram o atendimento de cerca de 90 civis gravemente feridos. Alguns médicos indicaram sinais de gás sarin.
Os informantes de Seymour Hersh- oficiais militares e membros da inteligência americana -explicaram o que teria acontecido.
O calor e a força da explosão de uma bomba de 500 libras detonaram uma série de explosões secundárias que podem ter gerado uma imensa nuvem tóxica, provocando a liberação dos fertilizantes, desinfetantes e outros produtos estocados no porão que se espalharam pela cidade.
Essa mistura altamente letal foi maximizada pelo denso ar matinal, que reteve os gases perto do solo, matando e ferindo civis inocentes.
Os informantes admitem a possibilidade de haver gás sarin estocado no porão, que teria também se incorporado à nuvem formada a partir da explosão.
O mais importante e indiscutível é que não havia sarin nas bombas lançadas pelo avião sírio.
OLHAROMUNDO publicou, na sua edição de 2 de abril, um excerto do relatório do cientista americano Theodore Postol, professor emérito do Massachussets Institute Technology (MIT), analisando a origem da bomba que desabou sobre a comunidade de Khan Shekhoun.
Do seu relatório de 14 páginas, destaco o seguinte trecho: “ Revisei cuidadosamente os documentos fornecidos pela Casa Branca e acredito que eu possa demonstrar, sem dúvida, que o governo dos EUA não dispõe de um conhecimento concreto de que o governo sírio foi a origem de ataques químicos a Khan Sheikoun, em 4 de abril de 2017.”
Postol declara que a análise das fotos e vídeos que, segundo a Casa Branca, constituem uma evidência da origem do lançamento de gás, indica duas possibilidades:
A)- as fotos e vídeos citados pela Casa Branca retratam cenas reais, sem maquiagem. Nesse caso, o ataque só poderia ser disparado por indivíduos em terra, não por avião.
- B) as fotos e vídeos foram muito provavelmente encenadas, preparadas para parecerem provas com que se pretendia enganar a opinião pública. Seus autores só poderiam ser membros dos grupos dominadores da cidade -os rebeldes terroristas do Nussra e do Abdel al-Sham. Sua ideia fora simular um ataque a gás pelo governo sírio, usando fotos e videos, distribuídos urbi et orbi.
Diante da reportagem de Hersh e do estudo de Postol não se pode negar que Assad era inocente. E que a ineligência americanos estava por dentro. É Impossível que Trump, seu Conselho de Segurança Nacional e pelo menos o Secretario da Defesa, James Mattis, não tivessem sido informados.
O governo Trump viu uma grande chance de se valorizar como corajoso chefe guerreiro perante seu povo. Era uma grande jogada, especialmente com sua imagem capengando cada vez mais, para se recuperar no IBOPE.
Aproveitou-a, lançando os 59 fulminantes mísseis contra o condenável governo Assad, conseguindo assim também ganhar pontos com a opinião pública do exterior.
A decisão de atacar um país que Trump sabia ser inocente das acusações, não só foi uma tremenda bofetada no direito internacional como também jogou a credibilidade americana junto à Rússia para o espaço. E pensar que generais e ministros dos EUA, ao se manifestarem contra acordos com os russos, costumam lembrar que se trata de gente que jamais os cumpria…
Acredito que os chanceles dos estados europeus já terão sacado que Trump subverteu a verdade em Khar Sheikhoun, com fake news em que ele é especialista. Preferem fazer de conta que o lançamento de mísseis contra os sírios fora justo.
Eles tem mais medo de Trump do que de Putin.