Israel tem o direito de se defender. Mas não assim.

.Somente o ódio  pode explicar o que levou o Hamas a praticar o bárbaro atentado que vitimou cerca de 1400l civis e militares israelenses

Mas o ódio, por descomunal que seja, pode e deve ser controlado para que não desencadeie reações incomensuráveis, fora dos limites da humanidade.

Embora explicáveis, os atos hediondos do Hamas em 7 de outubro não podem de maneira alguma ser justificados.

Acredito que os 2,3 milhões de habitantes do estreito de Gaza tem bons motivos para odiar Israel, mas somente muito poucos deixam que esses sentimentos tomem conta de si e os influenciem a praticar ações violentas.

Nunca antes, porém, com a brutalidade do atentado recente.

Em 2007, com a vitória do rebelde Hamas na única eleição democrática de Gaza, Israel decidiu fechar a região para o mundo.

Nem pessoas, nem remédios, nem materiais de construção, nem máquinas industriais ou aparelhos domésticos, nem alimentos, entre muitos outros bens essenciais à vida moderna poderiam entrar ou sair da Faixa de Gaza.

Nesses anos terríveis, sucederam-se muitos conflitos de curta duração, provocados por Israel ou por Gaza, como retaliações às agressões sofridas.

Quando esses conflitos se agravaram, 5 guerras se sucederam – em 2009, 2012, 2014 (a única em que Israel invadiu a Faixa) 2021 e 2023 (maio).

Para se contrapor ao esmagador poderio militar de Telaviv, Gaza lançou foguetes, a princípio precários e só ultimamente eficazes.

Os palestinos  têm por si as leis de guerra, que lhes  dão  o direito de se defender de um país que a ocupe pela força.

A enorme desproporção entre os exércitos, condenada pela  ONU, levou Israel a  matar ilegalmente muitos milhares de civis palestinos, enquanto as cidades israelenses foram afetadas minimamente pelos foguetes do outro lado.

Já Gaza, atacada pelos bombardeios avassaladores da poderosa aviação de Israel, teve grande parte das suas habitações transformadas em escombros.

A mesma sorte coube a hospitais, escolas, campos de refugiados, escritórios, fábricas (atualmente só existe uma) ,mesquitas, igrejas, mercados ,plantações e implementos agrícolas.

Os aviões de Israel fora mais longe: bombardearam com precisão a estrutura urbana de Gaza, destruindo  redes de água e de saneamento e usinas de energia.

A devastação foi de tal ordem que o cardeal Martino chamou Gaza de “uma prisão ao ar livre”.

Os números de Gaza mostram essa desastrosa realidade.

Em 2020, o desemprego chegava a 46%, o dos jovens era muito pior: 70%. A pobreza atingia 2/3 da população.

Enquanto 13 mil casas foram destruídas pelas bombas israelenses,72 mil foram tão seriamente danificadas que  as famílias não puderam voltar a habitá-las.

E 80% das pessoas dependiam da ONU e de algumas organizações humanitárias para sobreviver.

Alguns tempos atrás, a ONU, sob o impacto dessa lúgubre paisagem, informou que, em 2020, Gaza se tornaria inabitável.

E se tornou mesmo, mas seus habitantes continuaram vivendo por lá.

Para onde poderiam ir?

Nos 16 anos do bloqueio de Gaza, o ódio ao opressor israelense, que os condenava a uma vida que não merecia ser chamada de vida, germinou na população. Foi crescendo, alimentado pelas bombas de Israel, e deu seus frutos, alguns  demais amargos, como os bárbaros atentados praticados pelo Hamas em 7 de outubro: o, assassínio de 1.400 civis e militares e o sequestro de 200 moradores inocentes ou turistas.

Indignado ,Netanyahu garantiu uma resposta militar mais arrasadora do que nunca.

E apressou-se a justificá-la com o mote popularizado urbi et orbi pelo amigo Biden:

: Israel tem o direito de se defender.

Tem mesmo, só que sem praticar crimes de guerra e violar rotineiramente o direito humanitário internacional.

É exatamente o que o Estado de Israel está fazendo agora: retaliando ações terroristas com ações terroristas.

Desde o início do conflito, ondas de aviões israelenses aterrorizam Gaza, destruindo casas e seus moradores, indiferentes ao fato de serem milicianos do Hamas ou inocentes civis, o que é proibido pelas leis internacionais.

Israel decretou o bloqueio total (sem exceções) de Gaza. Sem água, alimentos, eletricidade, medicamentos e combustíveis, o que constitui punição coletiva, crime segundo as leis humanitárias internacionais.

Daqui a pouco, o povo de Gaza só poderá beber água imprópria para consumo. Sem combustível e sem eletricidade, os hospitais entrarão em colapso. Sem medicamentos, as doenças avançarão .Sem alimentos , os horrores da fome se espalharão pelas. comunidades locais.

Houve tentativas em reuniões do Conselho de Segurança da ONU para ao menos amenizar este bloqueio desumano e ilegal, com a proposta de um corredor humanitário para levar, ao menos, comida, água, medicamentos e combustíveis  para o povo sacrificado. Retirou-se da proposta o pedido de cessar-fogo, com o objetivo de conseguir atender aos EUA.

Houve 12 votos a favor, 2 abstenções e um contra: e  os EUA, usaram seu poder de veto para derrubar a posição unânime dos demais países, favorável a oferecer algum alívio ao martírio de 2,3 milhões de pessoas .

A representante do governo Biden justificou sua aberrante decisão, alegando a falta de uma menção ao direito de Israel à  autodefesa…

A forma bizarra com que o governo de Telaviv exerce esse direito ficou bem clara quando ordenou imperialmente aos habitantes do Norte de Gaza que se mudassem para o Sul, onde ficariam até que os hierarcas do regime sionista permitissem a volta a seus lares. Foi ressaltado que no Sul estariam sujeitos a muito menos bombardeios.

Os palestinos teriam 24 horas (prazo depois adiado) para a viagem, usando roteiros seguros, livres de ataques israelenses.

Trata-se de transferência forçada de populações, mais um crime internacional para a coleção de Bibi Netanyahu.

A Organização Mundial de Saúde protestou: forçar a mudança dos habitantes que estivessem severamente doentes , equivaleria a condená-los a uma sentença de morte.

Cerca de metade dos moradores atenderam à orientação do governante sionista, buscando reduzir o perigo de serem alvos de bombas ou mísseis.

Sua confiança na palavra de Israel foi seriamente abalada quando um comboio se dirigindo ao Sul sofreu um bombardeio de aviões israelenses, causando a morte de 70 civis.

E ao chegarem à região de relativa segurança prometida por Israel, os crédulos palestinos viram que ali as bombas choviam  com a mesma intensidade do que no Norte. Sendo assim, muitos fizeram o caminho de volta, porque no Norte poderiam viver em casa em vez de nos acampamentos ou outros alojamentos improvisados no Sul.. .

Essa tendência irritou Israel.

Afinal, os civis palestinos deveriam obedecer a  seu ultimato para não atrapalhar seu  ataque terrestre a Gaza.

E o governo sionista rugiu: quem ficar no Norte será considerado cúmplice dos terroristas e tratado como tal.

Isso equivale a uma confissão de que Israel irá, fatalmente, matar civis palestinos, pois muitos deles permanecerão em suas casas no Norte da Faixa de Gaza.

Isso significa uma violação anunciada do mais importante dos direitos humanos, que é o direito á vida.

Para a lógica do governo ultradireitista israelense, está tudo bem. Como disse o ministro da Defesa, Yoar Gasllante, s palestinos não passam de animais. “Nós estamos lutando contra animais humanos e agindo adequadamente.”

“Mais tarde, realçando o  significado dessa ideia, uma bomba destruiu o maior hospital de Gaza, repleto até os olhos de feridos da guerra e refugiados. Calcula-se que houve algo entre 200 e 470 pessoas mortas, além de muitas centenas de feridas.

Israel declarou que fora um míssil do Jihad Islâmico que atingiu por engano o hospital, ,exibindo fotos dos satélites que, na verdade, não eram  lá muito claras.

 O Jihad contestou, lembrando que dois dias antes do ataque, oficiais de Israel avisaram que todos  os civis deveriam ser retirados do hospital. Provavelmente porque pegaria mal, até nos EUA, matar centenas de doentes como aconteceria.

Minha tendência é acreditar na segunda versão, embora as investigações não estejam concluídas.

Não me impressionam as opiniões contrárias de dois dos chefes de Estado mais submissos a Biden: Scholtz, da Alemanha (já não se fazem social- democratas como antes) e Sunak , do Reino Unido.

Até agora a única conceção humanitária de Israel foi conceder 24 horas livres de ataques para a entrada de caminhões, carregando alimentos, medicamentos e combustíveis. Não dará para muita coisa, mas pelo menos um certo número de refugiados e feridos será atendido.

Por sua vez, a hipocrisia  americana acaba de ser comprovada mais uma vez. Blinken, o secretário de Estado, declarou-se contra o cessar-fogo, pois, segundo ele: “Israel tem o direito de fazer tudo o que pode para garantir que aquilo (o atentado) não aconteça de novo.”

Poder fazer “Tudo o que pode” é um sinal verde para        quaisquer ações, sejam legais ou criminosas.

Um bom exemplo da aplicação desse direito foi dado pelo major da reserva, Giora Eiland: “Criar uma severa crise humanitária em Gaza é um meio necessário para atingir  nosso gol (a destruição do Hamas).”

Dirigindo-se ao Hamas, Nir Baarat, ministro da Economia, rilhando os dentes, clamou: “”Nós vamos extirpar vocês da superfície da Terra.”

Nesta guerra, mais uma vez, o governo sionista revela seus verdadeiros objetivos: livrar os territórios de Israel e da Cisjordânia da presença dos palestinos, seja eliminando quantos e quando for possível, seja  através de leis, regras e ações discriminatórias que tornariam  a vida deles tão insuportável que  acabariam saindo em massa, deixando toda a Palestina para os israelenses.

É a solução final do problema palestino.

No momento, ondas de bombardeios terríveis vem devastando o país. Em 6 dias, cerca de 6 mil bombas já foram lançadas em Gaza, contra 7.430 durante todo o ano de 2019 na guerra d/o Afegani;stão.

Até  hoje (21 de outubro) nesta guerra, os bombardeios israelenses mataram mais de 6 mil pessoas, das quais 2.360 eram crianças.

Foram destruídos hospitais e centros de saúde, mesquitas, escolas, mercados, farmácias, toda a infraestrutura urbana. As redes de água, esgoto e eletricidade foram liquidadas em guerras anteriores.

Milhares de moradias estão em escombros, bem como escritórios e oficinas. Quase todas as fábricas viraram poeira. Talvez todas, não sei o que aconteceu com a última que havia resistido às bombas israelenses e americanas , fornecidas graciosamente pelo bom Tio Sam.

Logo irá começar a invasão que deverá contribuir para a causa sionista com milhares de palestinos mortos e enormes pilhas de pedras , que restarem de imóveis arrasados.

No fim da guerra, não creio que o Hamas acabará, mas possivelmente será extremamente enfraquecido. Muitos milicianos terão se mudado para países onde seriam aceitos.

Os palestinos não-sectários não teriam por que continuar vivendo numa Gaza reduzida a ruínas, carente de todo o essencial para a vida- como moradias, serviços públicos, escolas, empregos e mesquitas.´

É este o futuro que Netanyahu e os seus almejam dar a Gaza depois darem ponto final à Gaza.

Pelas suas inúmeras infrações aos direitos humanos, explícitas nas leis internacionais, que os americanos ajudaram a elaborar nas Convenções de Guerra.

O próprio Biden, apesar de alardear constantemente que a defesa dos direitos humanos é uma pedra angular do seu governo, vem dando sinal verde para Netanyahu os violar.

E o faz de forma ativa.

Questionado a respeito de um cessar fogo, John Kirby porta-voz do Conselho Nacional de Segurança declarou que os EUA eram contra porque beneficiaria o Hamas. Acrescento que também civis inocentes.

De fato, seriam alguns dias sem bombardeios, poupando-se a vida, não só de membros do Hamas, como de civis de Gaza. Somente no dia 23 de outubro, a força aérea israelense comunicou que matara 700 pessoas, não se sabe quantos eram os terroristas e os civis.

O Brasil apresentou no Conselho de Segurança da ONU proposta para formar um corredor humanitário livre ataques para levar alimentos, remédios e combustíveis aos desesperados habitantes da Faixa de Gasa.

Não se falava em cessar-fogo que se sabia não ser aceito por Washington.

Atacava o criminoso atentado Hamas, mas não a criminosa retaliação israelense.

 12 países apoiaram, dois se abstiveram.

Só os EUA vetaram e, graças a seu poder de veto, a proposta de paz foi para o lixo.

Desse modo, os EUA deram uma banana para as posições de quase todos os países dos 4 continentes, muitos deles seus aliados,

Tudo para satisfazer Netanyahu, que não quer saber de cessar fogo.

Evidente. Se ele lançou essa terrível ofensiva exatamente para eliminar o Hamas e tornar Gaza realmente impossível de ser habitada, por que iria ajudar a viver aqueles que ele quer ver mortos?

A representante dos EUA na ONU veio com um motivo lamentável: a recomendação não serviria porque não afirmava o direito de Israel se defender.

Com o fracasso da ONU, mais uma vez desmoralizada por vetos americanos a críticas às violências israelenses, tudo aponta para uma catástrofe humana.

A União Europeia começa a despontar como uma esperança.

Seus países foram unanimes em condenar duramente o Hamas e seu insano atentado.

Á medida que Israel passou a ignorar as leis internacionais e os direitos humanos, com ataques arrasadores e atitudes tirânicas, uma fratura começa a se esboçar.

Manifestações populares pela causa palestina espalharam- nos Estados Unidos, na União Europeia (em Londres, foram 100 mil pessoas), no Canadá e na América Latina.

Oliver Varhelyi, comissário da União Europeia para as questões das vizinhanças, declarou que o auxílio europeu à Palestina de 929 milhões anuais, seria suspenso.

A Irlanda, a Holanda e a Espanha protestaram. Disseram que agora que Israel bloqueia a  entrada de alimentos, eletricidade e medicamentos a Gaza, o auxílio era mais necessário do que nunca. E afirmaram que não seria suspenso, faltava Varheli base legal para seu ato.

800 membros do staff da União Europeia escreveram uma carta, acusando a presidente da comissão europeia Ursula von der Leyens de ter posições totalmente enviesadas em favor de Israel e de não ter sequer mencionado a necessidade de haver um Estado Palestino independente, que é política oficial da União Europeia.

A dinamarquesa Margrete Auken, membro do parlamento europeu, afirmou ao jornal Middle East Eye que Israel está cometendo um genocídio em Gaza.

 Acrescentou que a Europa também estava omissa. ”Onde estão os protestos das nossas lideranças? ”Por que não temos a mesma posição diante  de Israel que temos diante da Rússia”?  .

E completou: “Em vez de ser cheerlanders para o cerco de gaza, nós temos de usar nossa influência sobre Israel, para se comportar e exigir um cessar-fogo, agora.”

Em resposta, digo não existem mais líderes europeus como de Gaule e Merkel, que não aceitavam a hegemonia dos EUA, e queriam assumam independência nas questões internacionais.

Aliado a Merkel, Macron até que tentou pregar essa posição, mas na falta da líder alemã, tornou-se um oportunista que rejeita o cessar-fogo como Biden quer.

Scholcz no início da guerra da Ucrânia tentou agir com certa racionalidade na Frente liderada por Biden, mas assustou-se com a pressão americana e enquadrou-se no papel reservado a ele.

  Por enquanto, quase todos o s líderes da Europa estão lado de Netanyahu, seguindo a liderança de Biden.

Mas à medida que as forças israelenses pratiquem mais ataques terríveis contra as leis humanitárias internacionais, as pessoas irão tomando consciência da catástrofe humana, que se desenha em Gaza.

Não é possível que o terror israelense não impacte as emoções de milhões em passeatas, reuniões, protestos e até conversas.

Mas as vozes daqueles muitos, que se erguem pela salvação do que ainda resta de Gaza e de sua população, ser tornará um clamor que poderá ser ouvido pelos eleitores, no pleito do ano que vem nos EUA.

Terá Biden já pensado nisso?

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