Olhando para frente, para o novo ano, não dá para ser otimista. As pesadas nuvens do radicalismo impedem que os líderes visualizem caminhos certos para as crises que rondam o mundo.
Em 2006, o povo americano demonstrou total desaprovação à guerra do Iraque, considerada como o principal problema nacional. Mês a mês, os números das pesquisas foram cada vez mais definitivos. Eles se confirmaram nas eleições legislativas, quando o Partido Democrata venceu o Republicano nas duas Casas. Logo em dezembro, nova pesquisa mostrava que, por 68% x 26%, a nação desejava a retirada das tropas a partir do primeiro semestre de 2007.
Na mesma época, o Grupo de Estudos do Iraque, formado por especialistas republicanos e democratas, apresentou suas propostas para solucionar a crise: acelerar o treinamento das forças iraquianas, engajar a Síria e o Irã no processo de paz, além de sair do Iraque e o mais breve possível, já em 2008, pois o clima do país não seria saudável para as forças de ocupação. Segundo pesquisa do Grupo, 61% dos iraquianos achavam “adequado” atacar os soldados americanos onde fosse possível.
Esperava-se que, de olho nas eleições de 2008, Bush ouvisse o recado das urnas, ainda mais que teria pela frente a oposição democrata, dominante nas duas Casas, marcada por infinitas condenações à guerra do Iraque. E isso significava muito. Já dizia o representante Dennis Kucinich: “Só há um jeito de os EUA saírem do Iraque antes do fim do mandato do presidente Bush: que o Congresso corte os fundos para as forças militares”.
Mas parece que, para o presidente, 2008 está longe – haveria tempo para reverter as tendências da opinião pública. Quanto às ameaças da oposição… Ora, já não se fazem mais democratas como antigamente.
Alguns dos seus principais líderes aplaudiram com entusiasmo o que Bush classifica como “mudança” de planos: em vez de sair, aumentar os efetivos do exército no Iraque em 20 a 30 mil soldados. Para isso, está pedindo ao Congresso mais 99 bilhões de dólares, os quais, somados aos recursos já aprovados, somarão 170 bilhões, somente para 2007.
Repete assim os maus exemplos de dois antecessores – Johnson e Nixon – na Guerra do Vietnam. Ambos, quando sentiram a guerra perdida, ao invés de buscarem a paz, lançaram contra os vietnamitas reforços maciços, equipados com toda sorte de armamentos. O resultado foram vários anos a mais de uma guerra sabidamente inútil e sem chance. Que causou a morte de cerca de 2 milhões de asiáticos, a maioria civis, e 58 mil soldados americanos antes de os Estados Unidos acabarem entregando os pontos.
O aumento dos efetivos militares provocará certamente não só o aumento das baixas de iraquianos, tanto civis quanto insurgentes, como também de soldados americanos. Mais tropas significa mais combates, mais episódios tipo “My Lai” e Abu Ghraib – que acabam fatalmente acontecendo, ensejando uma radicalização maior do conflito.
Panorama semelhante se visualiza na Palestina. A invasão do Líbano, bem manipulada internamente pelo governo de Israel, levou seu povo a jogar todas as culpas nos árabes. Mas o governo foi considerado fraco por não ter liquidado o Hizbollah. Com isso, cresceu o ódio e as “pombas” israelenses tiveram de se recolher aos pombais. Sintomática é a grande liderança nas pesquisas hoje usufruída por Netanyahu, político bem à direita de Sharon, considerado o “premier” ideal por 26% contra 13% do segundo colocado. Provavelmente, para satisfazerem esse sentimento belicoso, as forças armadas têm sido particularmente impiedosas nos ataques à Cisjordânia.
Como toda ação gera uma reação igual e contrária, o provável é que tanto o Hamas quanto o Fatah, que hoje brigam entre si, tendam para posições ainda mais duras, empurrando para bem longe as perspectivas de paz na Palestina.
No Irã e na Coréia do Norte, o clima continua radical e nada sugere que possa se amenizar em 2007.
Ahmadinejad manteve-se firme na defesa do seu programa nuclear, jurando que suas finalidades eram pacíficas. Apoiado pela China e pela Rússia, conseguiu passar o ano sem sofrer sanções.
No entanto, prejudicou sua imagem com destemperos verbais, pressagiando o fim de Israel e negando o Holocausto (seria correto e eficaz se ele denunciasse aqueles que o usam em beneficio próprio). Derrotado pelos moderados nas eleições municipais, ele repetiu Bush; fez ouvidos moucos ao recado das urnas em favor de mais equilíbrio e ponderação. Sua recente declaração sobre o programa atômico iraquiano é pelo menos provocativa em relação às potências ocidentais: “A nação iraniana continuará seguindo seu caminho nuclear com toda força e breve celebrará uma vitória nuclear”.
Acordos parecem longe também na Coréia do Norte. O país voltou à mesa de negociações por pressão da China, de quem seu povo depende para não morrer de fome, para logo retirar-se por uma estranha atitude yankee. Quando se esperava toda boa vontade do governo Bush para se resolver a questão, ele ordenou sanções financeiras contra Piong-Yiang. Ante o protesto norte-coreano, teve o cinismo de responder que “uma coisa nada tinha a ver com a outra”. Ficou uma clara impressão de que Bush não deseja acordo algum. Há quem diga que o fim do regime comunista seria seu verdadeiro objetivo.
Olhando para frente, para o novo ano, não dá para ser otimista. As pesadas nuvens do radicalismo impedem que os líderes visualizem caminhos certos para as crises que rondam o mundo.