França, Reino Unido e Canadá ameaçam sancionar Israel.

Acredite se quiser.

Desde sua fundação, em 1948, o Estado de Israel desafia as leis de guerra e o direito humanitário internacional.

O Conselho de Segurança da ONU já aprovou 49 resoluções condenando o regime sionista por suas ações desumanas e ilegais.

Israel rejeitou todas — e tudo ficou por isso mesmo.

Nem mesmo a Europa, berço da civilização, teve coragem de usar penalidades para forçar o regime sionista a respeitar as normas criadas para regular as relações internacionais.

Os EUA não iriam achar nada bom. Eles consideram Israel seu principal aliado e lhe garantem total apoio militar, político e econômico.

Sendo fiéis seguidores de Washington, convinha aos europeus acompanhar as posições da política externa americana.

Inclusive, é claro, admitir o governo de Telavive no seleto grupo das nações respeitáveis e receber Bibi e seus hierarcas como hóspedes de honra.

Até agora, as nações da Europa trataram Israel como um parceiro, um aliado, alguém com quem compartilham valores — como afirmou o ex-primeiro-ministro Scholz, da Alemanha (devia estar de brincadeira).

Claro, para preservar sua imagem externa de dignidade, os líderes das nações do Velho Mundo por vezes até emitiam críticas a eventuais feitos abusivos de Israel, pedindo mudanças que o alinhassem às leis humanitárias internacionais.

Os chefes de Telavive nunca mudavam nada, os europeus consideravam seu dever cumprido — e tudo continuava como antes.

Na atual guerra de Gaza, esse enredo pareceu se repetir.

Rompendo um curto cessar-fogo, em 18 de março, Israel voltou a bombardear Gaza diariamente, tendo assassinado, a partir desse dia, 3.822 palestinos inocentes — muitos deles crianças, incluindo bebês.

Paralelamente, ordenou o bloqueio total da entrada de víveres e medicamentos no istmo.

Em grande número de países, manifestações e passeatas sucederam-se, expressando a indignação mundial diante dessas graves violações dos direitos humanos dos palestinos.

Os governos aliados se viram constrangidos a pressionar Israel.

Para acalmar esses protestos, o premiê Netanyahu permitiu que chegassem a Gaza caminhões com víveres para aliviar o sofrimento dos palestinos.

Só que eram 130 caminhões, quando 600 seriam necessários diariamente — quantidade enviada antes do começo da guerra.

Nos primeiros dois meses do bloqueio, o Programa Mundial de Alimentos (WFP) fornecia comida somente à metade da população, suficiente para atender a apenas um quarto das suas necessidades básicas.

Em 25 de abril, esgotou-se o estoque de alimentos do WFP, o que causou o fim das suas atividades e o início de uma fome que cedo se tornou catastrófica, com toda a população enfrentando aguda insegurança alimentar. Caso a situação persista, estima-se que, nos próximos sete meses, 71 mil crianças com menos de cinco anos e 17 mil mulheres precisarão de tratamento para desnutrição aguda.

Enquanto Gaza morre de fome, milhares de caminhões com alimentos estão estacionados junto à fronteira, impedidos de entrar no enclave por ordem de Israel.

O regime sionista usa a fome como arma de guerra. Subalimentados, os palestinos ficam profundamente enfraquecidos, sem ânimo para resistir aos objetivos do governo sionista na Faixa de Gaza.

Netanyahu e seus mais aguerridos aliados não tiveram escrúpulos em anunciar uma nova ofensiva terrestre para ocupar todo o território da Faixa, perpetrando novos massacres de palestinos, com os seguintes objetivos:

– Erradicar Gaza como nação, transformando todas as suas edificações em escombros, pela intensificação dos bombardeios aéreos e de demolições com o uso de escavadeiras.

O enclave permaneceria por muitos anos sob o controle do exército de Israel, que planeja anexar 75% do território em dois meses.

– Concentrar a população de Gaza em três áreas estéreis, de onde não poderão sair até que algum país os aceite em seu território.

Os líderes palestinos sustentam que seu povo jamais deixará a terra dos seus ancestrais.

Como será Israel quem fornecerá os alimentos, temo que a fome seja usada para levar os palestinos ao desespero e à opção pela emigração — para onde os mandarem.

Netanyahu ainda não determinou se o território de Gaza será ocupado por assentamentos judaicos ou pela espampanante Riviera do Oriente Médio, imaginada pelo criativo Donald Trump.

Por enquanto, Gaza é um inferno para os habitantes palestinos.

Gradualmente, a humanidade tomou consciência dessa atroz realidade e passou a exigir cessar-fogo imediato e permanente, fim da ofensiva militar, criação de um Estado palestino independente e condenação da matança de palestinos inocentes pelas forças de Israel.

Esses apelos se espalharam pela Europa, apoiados até por nações aliadas próximas do governo de Telavive.

E chegaram até os mais altos escalões dos governos.

Em maio, a maioria dos países europeus — incluindo Reino Unido, França, Espanha, Holanda, Noruega, Suécia, Irlanda, Itália e Eslovênia — pronunciou declarações condenando as operações militares israelenses em Gaza e apelando para um cessar-fogo.

No dia 19 desse mês, os primeiros-ministros Starmer, do Reino Unido, e Carney, do Canadá, e o presidente Macron, da França, publicaram uma declaração conjunta que surpreendeu os observadores.

No início, a declaração foi dura. Deve ter irritado Netanyahu — mas não muito. Historicamente, os europeus costumavam, no máximo, limitar-se a criticar atos ilegais e desumanos de Israel, somente para impressionar a opinião pública de seus países. Acusações que nunca propunham punições para o país infrator: “Nós nos opomos fortemente à expansão das operações militares em Gaza. O nível do sofrimento humano em Gaza é intolerável.”

Em seguida, os três dirigentes apelam para que o governo de Israel garanta imediatamente a volta da entrega da ajuda humanitária, alertando que a negação israelense à assistência humanitária essencial aos civis é inaceitável e se arrisca a violar a Lei Humanitária Internacional.

Mas a declaração conjunta vai mais longe: “Nós condenamos a abominável argumentação usada recentemente por membros do governo de Israel que, cinicamente, dizem que, desesperados com a destruição de Gaza, os palestinos preferirão ser realocados em outro país.”

Depois de lembrar que sempre apoiaram o direito de Israel se defender do terrorismo, afirmam que isto agora está sendo feito de forma amplamente desproporcional.

E, surpresa!: “Nós não ficaremos inertes enquanto o governo Netanyahu prossegue realizando essas graves ações. Se Israel não cessar a retomada da ofensiva militar e não levantar as restrições na ajuda humanitária, nós tomaremos, posteriormente, ações concretas em resposta.”

Finalizando, a declaração dos dirigentes ocidentais exige o fim da expansão dos assentamentos e reafirma: “Nós não hesitaremos em tomar ações adicionais, inclusive sanções dirigidas.”

Bem, em 75 anos de relações com Israel, esta é a primeira vez que os europeus e o Canadá ameaçam sancionar Israel, caso o Estado sionista persista na violação dos direitos humanos internacionais.

Será o começo do fim da impunidade israelense?

Aparentemente, a maioria dos comentaristas ocidentais acha que não. As ameaças dos três governantes não passariam de mera retórica.

A ambiguidade de Starmer e Macron — cujas posições na Guerra de Gaza costumam vacilar, ora apoiando um dos contendores, ora apoiando o outro — e a incerteza quanto ao que realmente pensa Carney, até agora omisso no debate da questão, geram fortes dúvidas.

O fato de Netanyahu ter dado pouca atenção às ameaças incomuns feitas por três importantes nações — duas delas (França e Reino Unido) aliadas de Israel — parece indicar que pouca gente em Telavive se sentiu preocupada.

E Israel, por enquanto, não atendeu às solicitações ocidentais.

Por outro lado, o Reino Unido já se mexeu: Starmer suspendeu as negociações com Israel sobre livre comércio, aplicou sanções sobre três líderes das ações violentas dos habitantes dos assentamentos judaicos e convocou o embaixador israelense para explicações.

É pouco, mas é um começo.

Admito que só iremos acreditar nas boas intenções dos três países do Ocidente quando forem aplicadas “medidas concretas” contra Israel, como sanções, corte do envio de armamentos, sobretaxas ou suspensão da importação de produtos israelenses — e mesmo boicote das relações econômicas, militares, científicas, culturais e diplomáticas dos países europeus com o país sionista.

É possível. Afinal, fizeram isso com a Rússia.

Acredite se quiser.

OLHAROMUNDO,POLITICA INTERNACIONAL

Luiz Eça

www.olharomundo.com.br

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *