Por palavras e obras, Trump já informou urbi et orbe que os EUA fazem o que bem entenderem, ignorando direitos humanos, ONU, leis internacionais, etc. Quanto aos demais países, que sigam o que a Casa Branca decidir. Do contrário, lá vão sanções (ou mísseis)!
Essa política está sendo aplicada na postura yankee diante do Acordo Nuclear com o Irã.
O governo Trump tirou os EUA para fora, renegando sua co-autoria nesse acordo internacional. E proibiu os outros países de negociarem com o Irã, sancionando os desobedientes com o fechamento do mercado americano para as empresas deles.
É do interesse americano levar a economia iraniana ao caos para empurrar pela garganta dos iranianos a renegociação do acordo nuclear nos termos ditados pela Casa Branca.
Acontece que as empresas da União Europeia não queriam perder as grandes oportunidades de lucro oferecidas pelo Irã.
Cansada de abaixar a cabeça diante das imposições imperiais do desaforado The Donald, a Europa resolveu reagir.
Como notou Federica Mongherini, Alta Comissária da União Europeia para Relações Internacionais: “Nenhuma nação soberana pode aceitar que alguém decida com quem você está autorizado a negociar.”
Assim ela disse e assim está sendo feito.
A União Europeia tomou contra-medidas para garantir a suas empresas o direito de manter relações econômicas com Teerã. O The Guardian de 6 de agosto informou o que os europeus estão aprontando: “As firmas europeias foram instruídas a não respeitar às exigências da Casa Branca para que encerrem todos os seus negócios com o Irã. Aquelas que decidirem sair por força das sanções dos EUA terão de receber autorização da comissão europeia, sem a qual irão encarar os riscos de serem processadas pelos estados membros da União Europeia. Um mecanismo está também sendo aberto para permitir que tendo negócios afetados pelas sanções, os europeus possam processar a administração dos EUA nas cortes nacionais dos estados-membros. “
Ainda não deu tempo para se aferir os resultados destas ações e já os europeus armam novas jogadas para inibir a prepotência da Casa Branca.
Junto com a China e a Rússia, eles criaram o chamado SPV (Special Purpose Vehicle), para qualquer país poder comerciar com o Irã sem ser penalizado pelos EUA. Assim, o SPV irá permitir exportações e importações de e para o Irã, fugindo das sanções do Tesouro americano.
O mecanismo é simples.
Vamos tomar como exemplo uma exportação de petróleo do Irã para a França. O valor da transação será creditado para a petrolífera iraniana que pode então acumular créditos para usá-los como pagamento de, digamos, sondas fornecidas pelo Reino Unido. Em todas estas operações, ninguém precisa de dólares ou usa os serviços da banca internacional.
Uma empresa multinacional europeia, com apoio estatal, será fundada para intermediar as transações do Irã com empresas de outros países, não necessariamente da comunidade europeia.
Negociando com os iranianos sem que haja uma transferência internacional de dinheiro, as sanções bancárias dos EUA não poderão ser aplicadas.
Falando a repórteres, em 25 de setembro (VOA News), Federica Mogherini, informou que o SPV deverá começar a funcionar ainda antes de novembro, prazo que Trump deu para países compradores de petróleo iraniano derem fim a essas operações. Ou enfrentarem o braço forte de Tio Sam.
Provavelmente o SPV não contribuiu para a paz de espírito de The Donald. Mike Pompeo, seu fidelíssimo secretário de Estado, declarou-se publicamente “perturbado e mesmo profundamente decepcionado” com o lance dos habitualmente conformados europeus. A seguir, ele pontificou: “Esta é uma das mais contra-produtivas medidas imagináveis para a paz e a segurança regional e global.”
Uma retumbante condenação que se justifica: Pompeo e seu amado chefe costumam confundir os interesses políticos da Casa Branca com as grandes causas da humanidade.
Altos funcionários americanos fizeram eco ao mal estar dos grandes chefes dos Estados Unidos de Donald Trump. Orgulhosamente, garantiram que seu governo não vai deixar que os europeus debilitem suas sanções.
A pressão de The Donald e fâmulos deve ter subido ainda mais ao lerem mais uma estocada desferida por Federica Mogherini, em entrevista nos bastidores da Assembleia Geral da ONU, em Nova Iorque.
Logo depois dela afirmar que a União Europeia considera inaceitável os EUA pretenderem decidir com quem a Europa está autorizada a comerciar, foi confrontada com uma pergunta atrevida: “O SPV não representaria um desafio ao dólar como reserva monetária?”.
Sem vacilar, a gentil Federica respondeu: “Ainda estamos num estágio inicial, mas pode ser que acabe resultando nisso, sim.”
E completou: “ Certamente, faz com que nós, de outras partes do mundo, nos perguntemos, que tipo de autonomia (financeira) nós temos?”
Assim caminha a humanidade.