Até certo ponto, Netanyahu tinha razão: as sanções contra o Irã falharam.
Seu objetivo era destruir a economia do país, criando uma crise tão dura que atingisse os cidadãos em cheio, transformando sua vida num inferno.
E os lançasse contra o regime, culpado dos seus sofrimentos, promovendo grandes manifestações de rua, que pusessem a revolução islâmica na corda bamba.
As sanções, de fato, produziram um efeito devastador.
Com a economia estrangulada por elas, o crescimento do país retroagiu. Caiu de 1,2%, em 2011, para 0,9% negativos, em 2012, conforme relatório da CIA.
No mesmo período, as receitas das exportações de petróleo -80% do total da nação- reduziram-se em 60%.
O bloqueio da importação de drogas essenciais atingiu duramente centenas de milhares de iranianos gravemente doentes. E um número elevado deles teve morte prematura.
A inflação somou 25%, em 2012, enquanto o rial se desvalorizou em 80%.
O desemprego chegou a 20%, com o fechamento de muitas indústrias e bazares.
Com isso, as condições de vida da população pioraram de forma acentuada.
Aparentemente, as sanções estariam dando certo, deixando o povo enfurecido contra o governo e seu programa nuclear, a fonte de todos os males.
Mas, as aparências às vezes enganam, mesmo.
Pesquisa realizada pelo instituto Gallup, publicada pelo Washington Post em 1 de fevereiro último, apurou que 63% da população querem a continuação do programa nuclear apesar das sanções, elas sim as grandes culpadas.
Apenas 17% são contra e 19% não sabem ou não quiseram responder.
Aconteceu um verdadeiro boomerang.
As sanções voltaram-se contra os fins pretendidos pelo Ocidente: acabaram fortalecendo o regime que pretendiam solapar.
As razões são várias.
O governo conseguiu proteger a população pobre contra os piores efeitos da crise, ou seja, a carestia.
Ele promoveu o tabelamento do preço dos alimentos básicos e da gasolina de modo a acompanhar o crescimento da inflação, o pagamento de cerca de meio salário-mínimo às famílias pobres e um grande programa de casas populares a baixo custo.
Em segundo lugar, a classe média que é quem sofre mais os efeitos da crise , pois não recebe o “bolsa família” e está acostumada a consumir alimentos não sujeitos a tabelamento, além de perder mais empregos devido ao fechamento de pequenos negócios e redução de atividades industriais, está desanimada.
Não parece disposta a repetir as grandes passeatas de protesto de 2009, contra a apuração das últimas eleições presidenciais.
Parte dela, aliás, critica mais as potências estrangeiras, responsáveis pelas sanções, do que o governo.
Em terceiro lugar, a campanha de denúncias pelas autoridades sanitárias iranianas e s ONGS internacionais levou o Ocidente a adotar regras para permitir a exportação e drogas e equipamentos médicos para o Irã.
Elas não cumprem integralmente seu objetivo, mas tendem a ser mais efetivas, aliviando a situação dos doentes iranianos.
Mas esta situação é transitória, as sanções (mais destruidoras a partir deste mês) exercem um contínuo ataque contra a estabilidade do Irã e a retomada do seu processo de desenvolvimento.
Em outubro do ano passado, a inflação chegou a 4,5%, taxa que, se mantida, levaria a insuportáveis 70% anuais.
Por ação do governo, em novembro, a taxa passou a cair. Foi para 2,5%, em dezembro e 1,7%, em janeiro de 2013. Que ainda é alta, mas deve continuar em trajetória descendente pelo menos nos próximos meses.
Enfrentar a retração da atividade industrial e do consequente desemprego tem sido muito difícil para o governo.
O medo causado pelo conflito contra as poderosas nações ocidentais, incluindo as ameaças de guerra, e as barreiras quase inexpugnáveis para a exportação dos produtos industriais e importação dos equipamentos e matérias primas necessárias, impedem os investimentos privados.
Os empresários locais preferem colocar seu dinheiro em aplicações líquidas até que a situação se normalize.
Com isso a produção declina, refletindo-se num desemprego de cerca de 25% da força de trabalho de 20 milhões de empregados – ¼ da população.
O governo tem procurado neutralizar esse problema buscando fontes alternativas para o suprimento de importações básicas.
Conseguiu acertar contratos comerciais bilaterais com nações dispostas a ignorar a ira da Casa Branca contra essa desobediência a suas sanções, como a China, a Índia e a Turquia.
O Irã é o maior fornecedor de gás natural à Turquia que paga com liras turcas, convertidas pelo Irã em ouro.
O ouro é uma moeda bem aceita nas transações internacionais.
Os EUA autorizaram essa “alternativa turca” mas só por 6 meses, a vencer em julho.
No entanto, os turcos pretendem desafiar o diktat da Casa Branca, conforme afirmou um ministro turco: “Continuaremos a exportar nosso ouro a todos que quiserem. Não temos restrições e não aceitaremos restrições impostas por outros.”
Esta resistência iraniana às sanções fornece a Netanyahu sólidos argumentos para voltar a defender a ideia de bombardear as instalações nucleares do país.
E é o que ele fará, dizem os analistas, logo que conseguir formar a coalizão de sustentação a seu governo, no Knesset.
Isso não interessa em nada a Obama.
Foi para tentar conseguir desanuviar o ambiente que ele pôs Binden em ação.
As declarações do vice- presidente , logo aplaudidas pelo ministro das Relações Exteriores iraniano, Salehi, em favor de negociações diretas entre os dois países, pegaram bem.
Imediatamente o rial valorizou-se 5% em relação ao dólar, no mercado livre.
Esperava-se que os líderes do governo de Teerã topariam correndo a oferta de Binden.
Mas o supremo líder, o aiatolá Kamenei cortou esse barato.
Nem bem Biden e Salehi tinham acabado de falar, ele fulminou:“Negociar com os americanos não irá resolve nenhum problema. Vocês apontam uma arma contra o Irã, dizendo que querem conversar. A nação iraniana não será assustada por suas ameaças.”
Esta posição deve ter sido estimulada pelos resultados da pesquisa Gallup na qual dois terços da população culpava as sanções e seus autores pelos seus problemas econômicos.
Kamenei sentiu-se reforçado pelo apoio popular para criticar os EUA e impor condições para aceitar a mão estendida por Binden.
Ele tinha em vista a reunião do Irã com as grandes potências, marcada para 26 de fevereiro, onde se discutirá o programa nuclear do país.
Depois das suas declarações, o Irã não vai chegar combalido pelas sanções, pronto a fazer profundas concessões.
Apoiado por seu povo, o governo parece disposto a somente negociar de igual para igual.