Ampliam-se as desavenças Alemanha-EUA.

Longe vão os tempos em que Barack Obama e Ângela Merkel eram fraternais amigos, compartilhavam suas posições em política externa.

Trump chegou ao poder e logo mudou radicalmente aquela amena relação.

Para o supremo mandatário yankee, a Alemanha tinha de se enquadrada. Afinal, quem manda no mundo é a América, e como sou eu quem mando na América, que a Alemanha baixe o tom.

E os alemães estavam cometendo vários pecados mortais, com sua abominável proximidade com Obama, pois pelo sagrado princípio do chorado Foster Dulles, secretário de Estado na gestão de Eisenhower: “Os EUA não tem amigos, tem interesses.”

The Donald achava que os interesses dos EUA estavam sendo ignorados.

Em primeiro lugar, o saldo do comércio exterior entre os dois países era amplamente favorável aos alemães. O que humilhava os novos habitantes da Casa Branca. E ainda por cima, prejudicava a sua economia.

Em segundo lugar, Merkel insistia em valorizar os interesses de seu país, quando o correto seria se submeter ao América,first trumpniano. Anomalia que a levava a tomar decisões eventualmente favoráveis aos negócios russos, em vez de contemplar as empresas de Tio Sam.

Por fim, a chefe do governo alemão insistia em liderar movimentos internacionais sabidamente contrários às sadias ideias de The Donald. Como a campanha internacional contra o aquecimento global, consagrada no Acordo de Paris, hostil ao livre consumo de combustíveis fósseis preferido por indústrias americanas, e a manutenção do Acordo Nuclear com o Irã, que fazia ranger os dentes do bom aliado, Netanyahu.

A irritação de Trump contra as atitudes independentes da ovelha negra alemã vem crescendo ano a ano.

As mais recentes foram as recusas do governo de Berlin de enviar tropas terrestres para ajudar os projetos bélicos dos EUA na Síria, um desacato à liderança imperial americana.

Diante da insistência de  James Jeffreys, o representante de Washington na região conflagrada,  o porta-voz de Angela Merkel, Steffen Seibeet foi duro: ”Quando eu digo que o governo alemão pretende continuar suas medidas anti-ISIS em andamento, então isto significa: nada de tropas terrestres (Reuters, 15-08-2019).”

Mas a rebeldia germânica não ficou nisso.

Respondendo à solicitação americana para que Berlin aderisse com suas belonaves à esquadra internacional, liderada pela Marinha dos EUA, de patrulhar o Estreito de Ormuz, veio com um inóspito “não.”

Um porta-voz do governo de Berlin informou: “A chanceler não imagina a participação em uma missão liderada pelos EUA na situação corrente e no momento corrente- ninguém do governo concorda com isso (em participar).”

Por sua vez, o sub-ministro do Exterior e ministro das Finanças, Olaf Scholz, esclareceu que “essa missão poria a Alemanha em risco de ser lançada em um conflito ainda maior.”

A indignação dos EUA somou-se à negativa alemã em aumentar seus gastos militares na NATO dos atuais 1,36% do seu PIB, para os 2% fixados para cada membro da organização.

Cansado de reclamar e não ser atendido, Trump resolveu jogar pesado. Ameaçou retirar parte dos 35 mil soldados yankees estacionados em território alemão, prevendo possíveis iniciativas expansionistas russas no país de Beethoven.

O governo Merkel respondeu que já gastava muito dinheiro nas tropas enviadas para a guerra do Afeganistão. Aliás, era o país que mais contribuía para ajudar os americanos na luta contra aos talibãs.

O habitante da Casa Branca fez que não ouviu. Mas, Richard Grenell, seu embaixador em Berlin, entrou na discussão para falar pelo patrão. E o fez de uma forma nada diplomática, censurando o governo Merkel. Clamou que, enquanto os EUA mantém tropas para defender a Alemanha, a Alemanha “gasta seus saldos orçamentários em programas domésticos.”

 E Grenell ainda sugeriu que as tropas da América deveriam mudar-se para a Polônia. (Deustche Welle, 09-082019).

A maioria do povo alemão não demonstrou ter ficado assustada com as ameaças. Pelo contrário, até achava uma boa ideia a partida dos guerreiros de Tio Sam bom. Pesquisa realizada na ocasião, revelou que 42% das pessoas pensavam assim e apenas 37% queriam que os soldados ficassem (The Independent, 11-07-2019).

O embaixador Grenell tem se destacado pela forma com que se mete nos assuntos alemães, tratando o orgulhoso país como uma republiqueta do Caribe ou uma ilhota do Pacífico.

Imagine que , algumas horas depois de tomar posse, já foi se atrevendo a dar ordens a empresas locais, tuitando que: ”As empresas alemãs que fazem negócios com o Irã devem parar seus negócios imediatamente.”

Não disse o que aconteceria caso não fosse obedecido. Mas, dava para prever…

Essa diatribe não passou batida. Várias personalidades criticaram o representante dos EUA. O líder do Partido Social-Democrata, integrante do governo, declarou que Grenell “parecia precisar de um tutor, na delicada arte da diplomacia.”

Grenell não se tocou.

Pouco depois, mostrou-se digno discípulo de Donald Trompa, permitindo-se  criticar os gastos da Alemanha com suas forças na NATO, tidos por ele como insuficientes. O que provocou um duro comentário de Wolfgang Kubicki, presidente do Parlamento: “Qualquer diplomata americano, que aja como um alto comissário de um poder de ocupação, precisa entender que nossa tolerância também tem seus limites.” E Kubicki reclamou das seguidas interferências do embaixador nos assuntos políticos de um país soberano, algo condenável por parte do representante de uma nação estrangeira.

Uma das mais graves foi a solicitação de que a construção do gasoduto Nord Stream 2 fosse suspenso pelo governo de Berlin. Esse oleoduto, cujas obras estão em em fase final, vai levar petróleo da Rússia para a Alemanha.

Não só será de grande importância para o país, como também tem participação societária alemã.

Não contente em requerer sua paralização, o representante dos EUA desta vez ameaçou explicitamente com sanções as empresas alemãs envolvidas no projeto.

AÍ, passou o sinal.

Jornais pediram que ele fosse declarado persona nom grata pelo governo de Berlin.

Protestos indignadoas choveram de todo o lado. Como o de

Carsten Schneider, deputado social-demcrata, que rugiu: “O sr. Grenell é m completo fracasso diplomático. O sr. Grenell prejudica as relações trans-Atlânticas com suas repetidas grosseiras provocações.”

Manter um embaixador num país da importância da Alemanha, cujo comportamento causa irritação e mesmo fúria geral parece um tanto inadequado.

No entanto, The Donald nem pensa em trocá-lo por alguém , digamos, mais diplomático. Parece que o presidente aprecia ter alguém do seu tipo desabusado numa hoje pouco amigável Alemanha.

The Donald não acredita em bons modos para se conseguir algo nas relações internacionais.

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