Com seu formidáveis poderes, o NSA assusta muito mais do que protege o comum dos mortais.
Ele está sendo visto por muitos, não como um super- herói high- tec, defensor da comunidade contra os terroristas, mas como uma ameaça, que volta suas super- armas contra o povo.
Entrevistado pelo The Guardian, Edward Snowden, denunciante dos programas de vigilâncias de telefones e internet, declarou: ”O NSA (Agência Nacional de Segurança) construiu uma infra – estrutura que lhe permite interceptar quase tudo. Eu, sentado na minha cadeira(no NSA), certamente tinha autoridade para grampear qualquer um…Mesmo que você não estivesse fazendo nada de errado, você seria observado e gravado.”
Podendo espionar os telefonemas, emails e atividades de internet dos americanos e, talvez, também do povo do resto do mundo, o governo de Washington tem os melhores recursos para obrigar qualquer cidadão a seguir suas ordens como ameaçar ou fazer chantagem com a oposição, através da fiscalização do Imposto de Renda; prejudicar pessoas mal vistas pelo establishment, processando-as com base em comunicações feitas com suspeitos; processar jornalistas (como já fez) simplesmente por terem se reunido com denunciantes de malfeitorias públicos, que deseja esconder.
Você dirá que Obama não faz isso.
Pode ser. Mas e um dos próximos presidentes?
Se for alguém tipo Nixon, o que não iria armar, usando os super- poderes do NSA!
Temendo os perigos desta mega violação da privacidade, uma inédita união da esquerda americana com a direita tradicional (que não é liberal só na economia) já está multiplicando protestos.
O senador Rand Paul foi mais além. Ele está procurando obter 10 milhões de assinaturas para um processo que moverá contra o NSA e o governo na Suprema Corte, requerendo proibição da vigilância de seus telefonemas.
E o senador Ted Cruz declarou que irá convocar seus colegas para exigir informações completas sobre esse programa de vigilância, antes de resolver que medidas tomar. Sua opinião é: “Eles (o governo) estão implementando o que parece ser um sistema de vigilância intrusivo e sem precedentes nos cidadãos americanos particulares.”
Mesmo a grande mídia está contra as iniciativas de Obama, apoiada por manifestações que vem de toda parte.
Na Europa, a indignação também é geral.
Autoridades da Europa Unida vão se reunir com autoridades americanas para cobrar explicações sobre possível controle de cidadãos europeus pelos novos programas de vigilância.
“Seria inaceitável e exigiria pronta reação da Europa Unida se o NSA dos EUA, de fato, estivesse processando informações europeias, sem permissão,” declarou Guy Verhofstadt, do bloco parlamentar liberal.
A ministra da Justiça da Alemanha, Sabine Leutheusser-Schnarrenberger escreveu no Der Spiegel:”Quanto mais a sociedade monitora, controla e vigia seus cidadãos, menos livre ela é.” Ela também pediu imediatas explicações dos EUA.
Partidos do governo e da oposição pressionaram a primeira-ministra Angela Merkel a exigir de Brack Obama garantias de que cidadãos europeus não seriam alvos de programas de vigilância.
Todas estas manifestações contrárias causaram um considerável ruído.
Obama deu suas explicações.
Insistiu em que os grampos eram essenciais para garantir a segurança do povo, em perigo na guerra dos EUA contra o terror.
Alguns deles já tinham até evitado atentados.
Nenhum cidadão inocente seria perturbado porque todas as ações de vigilância eram legais, cobertas por mandados de juízes federais.
Afirmações que passam longe da verdade.
Graças ao NSA teria sido evitado um único plano terrorista. Mesmo assim, as provas do uso das informações grampeadas na ação das autoridades eram bastante vagas e pouco concludentes.
Segundo a lei FISA (Foreign Intelligence Surveillance Act), os mandados de vigilância tem de ser, de fato, previamente aprovados por um juiz. Só que, de acordo com essa lei, o juiz, nomeado especialmente para analisar os mandados, está instalado no próprio edifício do Departamento de Justiça. Seu trabalho é secreto, não submetido a qualquer tipo de supervisão.
Tudo isso deve comprometer a independência do juiz pois ele quase sempre tem concedido os mandados requeridos pelas autoridades.
Pegou muito mal junto à opinião pública a colaboração das grandes empresas de internet- Google, Facebook, Microsoft, Apple, Yahoo, AOL e Paltalk – com o programa PRISM.
Todas se prestaram a atender ao pedido do governo de enviar ao NSA todas as atividades em internet dos seus consumidores.
Não poderiam alegar que se tratava de uma obrigação legal, à qual teriam de cumprir, porque o Twiter se recusou a atender ao governo, que não teve como forçá-lo.
Algumas chegaram a gastar somas substanciais para se adaptar aos serviços que o governo queria, visivelmente para bajular os donos do poder.
Em troca, desrespeitaram a confidencialidade das comunicações de seus clientes, traindo sua confiança, o que certamente vai danificar sua imagem junto a eles.
Por enquanto, a reação do público não está sendo tão maciça e exaltada quanto a dos políticos, jornais, organizações de direitos humanos e formadores de opinião em geral.
Pesquisa recente mostra que 57% acham que a denúncia dos programas de vigilância não alteram a capacidade dos EUA de evitar futuros ataques terroristas, com o que 30% não concordam.
6 em cada 10 americanos desaprovam o trabalho do governo federal, coletando registros telefônicos de cidadãos comuns para combater o terrorismo.
Para 46%, o governo conseguiu um correto balanceamento entre privacidade e segurança, enquanto 36% tiveram que o fator segurança pesa muito mais do que deveria.
Seja como for, o governo Obama não quer mudar nada (mais uma vez): pretende manter os programas do jeito que estão.
Vamos ver o que irá fazer depois de ouvir as queixas e exigências de Ângela Merkel e de outros aliados europeus.
É possível que também tenha de enfrentar no Congresso a oposição da esquerda democrata e dos conservadores liberalizantes do Partido Republicano.
A pressão popular só será determinante se ninguém mais aceitar a continuação indefinida do “estado de guerra.”
É ele que justifica os programas de vigilância de telefones e de internet.
Todos violam o direito a privacidade, firmemente inscrito na constituição americana.
Nos EUA, só se aceita a violação de preceitos constitucionais em casos de guerra, quando o governo precisa de poderes extraordinários para enfrentar a situação.
Em 2001, após o atentado das Torres Gêmeas, o governo Bush decretou que os EUA estavam em “estado de guerra” contra o terrorismo, especialmente da al Qaeda..
Foram aprovadas leis que lhe conferiam direitos extra- constitucionais, para permitir que protegesse os cidadãos dos atentados terroristas.
E assim os americanos concordaram em renunciar a grande parte das suas liberdades, em favor da sua segurança.
Agora, passaram-se 12 anos, Bin Laden está morto, a al Qaeda não tem mais condições de praticar atentados no exterior, a guerra do Afeganistão está acabando – sendo que os talibãs jamais atacaram o território americano (nem poderiam).
Seria absurdo manter um “estado de guerra”, com suas leis castradoras de liberdades individuais, só para combater atentados de alguns indivíduos exaltados e pouco eficientes.
Haverá sempre ataques desse tipo, enquanto os EUA provocarem o ódio dos islâmicos, ao defender as violências d Israel contra os palestinos- apoiar ditaduras ferozes como as da Arábia Saudita e do Bahrein – usar seus drones para matar inocentes no Paquistão, Yemen e Somália.
O próprio Obama concordou na necessidade de se por um ponto final no “estado de guerra.”
Infelizmente, não foi sincero.
Ele se contradiz, ao defender esses programas que violam a privacidade e representam uma ameaça latente aos cidadãos.
Que poderá se concretizar em perseguições e outros atos arbitrários e injustos nas mãos de eventuais futuros governos sem escrúpulos.