Grécia: entre o medo e a esperança.

Caso o partido Syriza vença as eleições de 25 de janeiro, os gregos poderão romper seu acordo com a União Européia.

Tecnicamente falido, o país foi salvo pela Europa com um socorro de 240 bilhões de euros.

Mas tudo tem seu preço.

A Grécia teve de aceitar um plano de austeridade extremamente rigoroso.

Em nome dos credores, a chamada troika – FMI,  Comissão Européia e  Banco Central europeu- impôs pesados cortes nos gastos públicos e aumentos de impostos, pegando duro nos direitos sociais.

Os resultados tem sido arrasadores.

A economia do país encolheu 25% desde 2008, com a  produção industrial diminuindo 35%.

A recuperação projetada pelo FMI para 2011 não aconteceu. E a recessão permaneceu – somente em 2014 deverá haver um crescimento mínimo, especialmente devido a um verão excepcional para o turismo grego.

Houve uma redução de 30% nos postos de trabalho, sendo que o desemprego passa de 27% (duas vezes maior do que em 2010). Depois de fevereiro de 2012, os salários para os jovens com mais de 25 anos sofreram uma redução de 22%, enquanto que os menores de 25 anos ganham 32% a menos. 551 suicídios no período 2009/2010 foram atribuídos à crise econômica.

Considera-se que a Grécia precisaria de 13 anos para sua economia recuperar o índice de 2008 e talvez duas décadas para reduzir o desemprego a números aceitáveis.

E apesar de todo o sacrifício o déficit aumentou e já está em insustentáveis 177% do PIB (em 2009 era 130%).

Em outubro do ano passado, o governo Samara (conservador) achou que era possível suavizar a barra.

Ele informou ao FMI que em 2015 pretendia interromper as medidas recessivas  do programa de resgate da dívida de 240 bilhões de euros. Acreditava que o país já estava estável e poderia antecipar a saída do programa prevista para março de 2016.

O FMI disse não, alegando que a Grécia ainda teria de enfrentar em 2015 um déficit orçamentário de 15 bilhões de euros.

Por isso, a troika exigia ainda mais austeridade, superávits primários de 3% em 2015, 4,5% em 2016 e ainda maiores nos anos seguintes.

O governo Samara abaixou a cabeça, resignado.

Devido a sua rendição, acabou caindo. O parlamento votou contra o candidato a presidente  apresentado por ele, o que causou, de acordo com a lei, a antecipação das eleições parlamentares para 25 de janeiro de 2015..

Conforme o resultado, o plano de austeridade liderado pela troika poderá ser detonado. Mais: a própria permanência da Grécia na União Européia estará em jogo.

A insatisfação popular com a situação do país encarna-se num partido considerado de esquerda: o Syriza.

Defendendo a substituição da austeridade econômica pela promoção do desenvolvimento, o Syriza representa para os gregos a esperança de que seus sacrifícios podem ter fim.

Fundado em 2012, o partido já nas eleições do parlamento europeu, em maio de 2014, obteve 26% dos votos.

Dali em diante, só cresceu. De acordo com a última pesquisa, ele se coloca em primeiro lugar na preferência do eleitorado, com, quase 4% mais do que os conservadores, que vem em segundo.

Como pela lei grega o partido mais votado recebe automaticamente mais 50 lugares no parlamento,  o Syriza, se vencer, tem tudo para formar o novo governo. Bastará o apoio de algum dos partidos pequenos.

O Syriza afirma que promover cortes orçamentários para gerar superávits anuais e assim pagar dívidas aos credores europeus traz recessão e pobreza  eternos.

Algo diferente dever ser feito: investindo no crescimento, haveria um aumento da renda nacional e as dívidas poderiam ser pagas, sem precisar deixar o povo na pior

As propostas básicas do Syriza priorizam não só o desenvolvimento, como também o resgate das necessidades básicas do povo.

Conheça algumas das principais:

-conseguir uma redução substancial nos débitos gregos;

– orçamentos balanceados em vez de superavits elevados;

–  reconectar a  rede elétrica sem demora a muitas famílias que perderam esse direito;

– garantir alimentação e abrigo para os sem teto;

– agir imediatamente para reduzir o desemprego através de programas públicos;

– aumento do salário-mínimo;

– reduzir a enorme carga de impostos e  estimular os investimentos públicos para acelerar o crescimento.

Comentando esse programa, disse Tsakalofos, provável ministro das Finanças num governo do Syriza: “Não estamos prometendo tudo para todos. As medidas de alívio não beneficiarão ninguém com renda mensal superior a 1.000 euros.”

O Syriza também moderou seu discurso  inicialmente agressivo.

Agora, fala em negociações com a Europa – não mais em exigências.

E seu principal líder já garantiu que seu partido não quer de modo algum tirar a Grécia da União Européia ou mesmo da zona do euro.

O que não tranqüiliza muito os líderes da Europa.

Temem que ceder, ao menos em parte, poderá ser um precedente perigoso. Particularmente para os países cujo povo está mais sofrendo os efeitos da crise, como Portugal, Irlanda e Espanha.

Eles tenderiam a reclamar que as reestruturações oferecidas à Grécia lhes sejam concedidas.

Mesmo países como Itália e França, que pressionam por abrandamento nas duras regras econômicas que tem de seguir, se sentiriam com mais direito ao alívio desejado.

Não é conveniente para a União Européia que as coisas cheguem a esse ponto.

No entanto, rejeitar o que pede o Syriza traria o risco dos gregos também endurecerem sua posição: optarem por cancelar o programa de austeridade e, fatalmente, pela saída da zona do euro. Talvez da própria comunidade.

Nesse caso os credores teriam de contabilizar perdas de 240 bilhões de euros, sendo que somente os alemães dariam adeus a 77 bilhões.

O que poderia ser desastroso.

Argumenta-se que os gregos não iriam tão longe, pois sua situação ficaria muito pior.

Além da Grécia não ter como pagar suas dívidas,  segundo o ministro das Finanças Hardouvelis, os bancos locais só dispõem de fundos para sobreviver até março. Fugas de capitais e quebras de bancos seriam inevitáveis, pressagiando um futuro perigoso.

Tudo aponta para a necessidade de uma negociação, com concessões recíprocas.

Uma redução da dívida não seria absolutamente fora do comum. Afinal, a própria Alemanha já foi rec ebeu esse benefício através do Plano Marshall e também do Acordo de Londres, em 1953.

Mais difícil será o FMI aceitar mudanças na tradicional receita de cortes nas despesas públicas, aumentos de impostos, elevados superávits orçamentários, etc – ainda que a História prove que não dá certo.

Há boas possibilidades da troika continuar ditando as regras na Grécia.

A vitória dos conservadores, embora improvável, pode muito bem acontecer,  pois a vantagem da Syriza, de acordo com as pesquisas, é pequena, cerca de 4%.

Embora cheio de esperanças de que seus sacrifícios podem acabar, o povo grego pode ter também medo do desconhecido. De ficar numa situação ainda pior num embate contra a poderosa Europa. E acabar não dando a maioria necessária ao Syriza.

Seja como for, o fato da oposição às políticas recessivas ter chegado tão longe na Grécia será um poderoso incentivo para que em outros países, partidos de posições semelhantes repitam a façanha.

Entusiasmado, Pablo Iglesias, líder do “Podemos”, da Espanha, declarou: “2015 será o ano da mudança na Espanha e na Europa. Começaremos na Grécia. Avante Syriza!”

A porteira já foi aberta.

 

 

2 pensou em “Grécia: entre o medo e a esperança.

  1. 240 bilhoes de euros jogados no lixo, A Grecia para sair da crise vai ter que se acostumar a produzir ,. tem que deixar o vicio de viver nas costas do mundo, e alavancar o progresso, senao mais 240 bilhoes de euros serao jogados no lixo,

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